segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Tempo de Fúria

T E M P O   D E   F Ú R I A

Texto e foto de Valéria del Cueto
Sua vida está boa? O céu da sua rota de vôo está de brigadeiro? Já sei. É hora de algo dar errado, de você passar uma raiva básica. Hum... Está tudo tão bom que nada pode atrapalhar seu bom humor? Aqui, em Cuiabá é fácil quebrar esta escrita e transformar sua vida, rapidinho, num inferno.

Como? Pegue aquele pepino básico, tipo a atualização da documentação da sua antiga motocicleta e tente resolve-lo no inferno da terra no CPA, o Detran.

Na primeira ida pegue as tarefas da sua gincana. Na segunda, já acreditando ter nas mãos tudo o que é necessário para descascar o pepino em pauta, prepare-se para conhecer o purgatório do inferno, ou o inferno do purgatório, como preferir.

Pra começar, o que você quer, nunca é no prédio em que está. Mude de bloco, pegue um bronze, sinta o calor da terra. Depois, entre na fila e imprima a(s) guia(s) para pagar. Aí, você já vai descobrir que além da vistoria lacrada que veio do Rio de Janeiro, tem uma taxa de R$13,50 só para abri-la. É s tesourada mais cara do estado.


Tá bom? É claro que não. Esta tesourada da fortuna não é feita no mesmo prédio, sequer no mesmo bloco. Dirija-se ao galpão “atrás do matagal”, explica um funcionário, ombreado por um exemplar das dezenas de cartazes espalhados pelas várias salas, boxes e/ou guichês dos diversos setores do Detran com os seguintes dizeres:

DESACATO
Art. 331 – Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela.
PENA – Detenção de 6(seis) meses a 2(dois) anos. Ou multa.

Na primeira vinda ao distinto e prestimoso órgão pensei com meus botões, enquanto esperava para ser atendida: “Nossa, o povo deve ser muito esquentado pra ter tantos avisos destes espalhados”.
Hoje, depois de pagar a guia e fazer um footing até “atrás do matagal”, em pleno sol do meio dia (você sabe do que estou falando). e descobrir que são necessários 40 minutos para que o Detran reconheça o boleto das taxas pagas em espécie (o  BB não aceita cheques de seus co-irmãos), ali mesmo, no posto bancário local, começo a entender que o recado era direto e certeiro para gente como eu, você, qualquer cristão não santificado.

Bom, 40 minutos assim, assim, por que o relógio do CEPROMAT não marca a mesma hora que os outros do país, seja lá em que fuso horário você se encontre. É diferente!

A espera é agravada pelas péssimas condições do tal galpão. Móveis detonados, infiltrações nas paredes. Um lixo. Certamente não é no conforto dos funcionários e usuários que a grana recolhida com as tesouradas milionárias está sendo aplicada.

O tempo voa... Menos para os 40 minutos determinados para a liberação dos documentos necessários para ( pasmem!) montar o processo. Isso quer dizer que somente uns três dias depois a licença será liberada.

A última notícia que me deram é que, apesar de haver passado mais de uma hora, a taxa não havia sido recolhida. Ainda. Ou seja: o comprovante de pagamento não tem validade no Detran!  Ora, cá pra nós, que eu tenha cara de bandida, caloteira e cascateira, tudo bem, mas não aceitar o comprovante do próprio posto da instituição é demais. Como também é abuso que todos os usuários sejam tratados como possíveis sustadores de cheques, razão pela qual, não correntistas do BB têm que pagar os boletos em dinheiro vivo.

Perdi a fleuma, o bom humor e a esportiva. Chutei minha pouca paciência e estou pronta para ser detida. Acho que prefiro a pena de dois anos de prisão, pois a opção mínima de 6 meses não será suficiente para desopilar meu fígado desse labirinto de exigências para expelir o documento de trânsito solicitado.

Importante destacar e sublinhar: nada desse tormento tem a ver com os funcionários do órgão. Todos solícitos e solidários com o sofrimento da clientela. Eles, realmente, fazem o que podem. O X da questão está no modelo de gestão, na forma de estruturar o serviço, nos procedimentos adotados. Tudo a favor... de quem mesmo?

Por isso, fica aqui um desafio: que uma “otoridade” entre no Detran disfarçada de cidadão comum e percorra o trecho (longo e tortuoso) entre obter informações e chegar ao fim de uma tarefa automotiva no departamento em questão.

Vai chegar a triste conclusão de que no Detran de Mato Grosso, vale o ditado: “Povo é gado”. E não adianta mugir, por que mugir, aqui, está escrito: dá cadeia!

Valeria del Cueto é jornalista e cineasta
liberado para reprodução com o devido crédito
Este artigo faz parte da série Parador Cuyabano

4 comentários:

Filipe Antunes disse...

Ah... porcaria de burocracia. Quase o mesmo em todo lado. E um pobre cidadão impotente, que nem viagra resolve a questão. Rsssssssss...

João Paulo Vinha Bittar disse...

Oras, a favor dos despachantes! Duvida de envolvimento deles com a politicagem para garantir que quem tenha dinheiro prefira pagar os serviços deles?

Valeria del Cueto disse...

Nós vivemos no mundo encantado dos despachantes. Mas não só no deles. Por que além deles, quem "organiza" o despacho também leva sua "bola".

João Paulo Vinha Bittar disse...

Pelo menos o (absurdo) crime de desacato poderá ser extinto, veja mais direto no Portal da Câmara dos Deputados.