Texto de Valéria del Cueto
Não tem escapatória. Esgotei todas as boas razões pra adiar este momento. As boas e as más. Tanto que, no momento, cometo a exceção de escrever direto no computador. O que isso significa? Que não tive um tempo pra mim na última semana. Se este momento especial tivesse ocorrido, certamente teria sido redigido à mão. Em qualquer lugar, menos no meu escritório.
Nada contra o escritório e tudo a favor da pausa contemplativa que sempre foi um elemento essencial na minha concentração produtiva. Mesmo quando era na fila de um banco ou de um cartório, por exemplo, o que várias vezes aconteceu na minha estadia em Mato Grosso, no ano passado.
Isso não quer dizer que tenha tido uma má semana. Ao contrário. Depois de mais de 20 dias em Uruguaiana, na fronteira oeste do Rio Grande do Sul, cheia de eventos, tarefas e reencontros, tive de ter fôlego de remador pra cair na vida carioca.
Larguei pra trás por apenas alguns poucos dias, contas pra pagar, TV no conserto, óculos que faltavam um parafusinho, rombo na parede da área de serviço, porta que está caindo e outras muitas inutilidades, pra me dedicar a coisas realmente importantes: familiares, profissionais e espirituais.
Tudo sem o menor dó ou sentimento de culpa. Mais uma vez, comprovo a teoria de que, pra romper com o cotidiano e abrir seus canais criativos, nada como um “perdido” na rotina. Tipo o meu. Jurei que voltaria em cinco dias e ampliei minha permanência por mais duas semanas. Muito lucrativas, por sinal....
Mas já estou fugindo do assunto: o retorno. É uma arte. Encarar os pepinos congelados e as novidades da rotina de forma positiva requer muito fairplay. Começo a achar que ele, o fairplay é uma questão de, digamos, experiência.
Hoje no restaurante, na mesa ao lado, um rapaz engravatado despejava seu stress através de um celular, com alguém disposto (ou obrigado) a ouvir sua churumela do outro lado da linha. O problema é que as pessoas em volta não pareciam muito satisfeitas em serem “contaminadas” pela irritação evidente do mauricinho, durante a refeição.
A pergunta é: será que as novas práticas tecnológicas não exigem a atualização das regras de boa educação? Onde e como difundi-las, considerando que as antigas regras estão enterradas por falta de ensino ou esquecidas na memória?
Ah, se fosse só isso... Tem tanta coisa acontecendo neste mundão!
OBS: “Perdido”, é quando você diz que vai, avisa que foi e parte pra outra quebrada. “Perdeu”, diz o assaltante pro cidadão. Corresponde a um resumo do antigo “Mãos ao alto, passe a grana”, tão comum hoje em dia, inclusive em lugares insuspeitos, como o Senado Federal e os Poderes Executivo e Judiciário só pra começar a lista.
Valéria del Cueto é jornalista, cineasta, gestora de carnaval