quarta-feira, 25 de junho de 2025

Manoelina Atlântica

Manoelina Atlântica

Texto e foto  Valéria del Cueto

Essa é uma crônica rapidinha que nem a vida.

Agora que o pato fez “quá” e tirou o mundo do eixo é tudo assim. Atropelado. Sem tempo para absorver os movimentos. O que dirá usufruir os momentos.

Não quero reclamar, apenas constato que está cada vez mais complicado manter os acontecimentos negativos fora do radar e invadindo o fluxo aqui @no_rumo do Sem Fim... que habito.

Me divido entre ser ativa e operante nas atualizações acompanhando o pancadão desritmado ou procurar boas energias e argumentos lúdicos para manter o moral elevado, vibrando numa sintonia positiva.

Se resvalo para o lado geminiano combativo e alerta, aquele que acompanha e analisa os acontecimentos e suas inexoráveis consequências, satisfaço o compromisso profissional e jornalístico que mantenho com o papel que escolhi para desempenhar no contexto planetário enquanto houver espaço para tal.

Tipo uma nano partícula a mais nesse mundão disposta a acreditar, trabalhar e difundir o humanismo. O bem estar geral.

Só mais uma micreza no meio de uma tempestade ácida que corrói o senso comum de solidariedade e amor ao próximo que deveria mover o mundo nesse momento tão complicado.

Dele, não quero falar. Consultem, caros leitores, as efemérides do ano da graça de 2025. Está tudo aí diante dos olhos, ouvidos e demais sentidos. Reais ou artificiais.

Escrito, descrito, gravado, analisado de forma minuciosa. Inexoravelmente indicando a vinda de tempos ainda mais difíceis.

Para evitar o esgotamento mental diante das circunstâncias, troco de gêmea. Deixo chegar a que persegue borboletas para fotografar.

A mesma que fica com pena das lagartas devoradoras das tenras folhas da renda portuguesa e, sem esmaga-las, tenta transportá-las a outros lugares do jardim para que possam se desenvolver e voltem aladas a flanar pelos caminhos floridos do meio do mundo.

Desvio o olhar das cenas brutais transmitidas maciçamente pelos meios de comunicação e amplificadas pelas redes sociais para a laranja natal, aquela que só serve para fazer doce, amadurecendo na ponta do telhado, balançando em cima do rio. A vejo amarelando na paisagem já de inverno.

Observo seu crescimento há meses. Desde quando quase despenquei pela janela, deslisando pelo telhado da garagem, em direção ao curso d´água lá embaixo.

Tentava colher uma goiaba antes que ficasse perpitola e os passarinhos começassem a beliscar a delícia quase madura. Disputa dura pelos melhores frutos. Ferrenha, concorda?

Na quase queda, estudando minhas chances de esticar o braço, jogando o corpo pra fora com as pernas agarradas na lateral do beiral, agarrar um chumaço de folhas que me permitisse puxar o galho do meu objeto de desejo. Reparei que a última chance de apoio aéreo, antes do desastre terminar dentro das águas do riozinho, seria me agarrar nos galhos não sei se frágeis da dita laranjeira.

Na ponta derradeira da ramagem vi a bebê laranjinha e comecei a acompanhar seu crescimento.

Como ainda estou aqui, alguns meses depois, deduzo que deixei a goiaba desejada para o deleite da passarinhada. Ia dar ruim.

No mesmo processo observatório vi, na outra margem, explodirem os botões das flores do pé de manacá. Lá do outro lado da ponte...



Estou me devendo um registro fotográfico desse visual exuberante de tom lilás com toques brancos salpicados. Um espetáculo!

Sim, diz essa gêmea à outra, o mundo(ainda) é belo.

Sei que sou privilegiada por ter essa rota de fuga, tenho consciência que isso não é para qualquer um.

E esse é o motivo que me move ao descrever essas miudezas tão manoelinas.

Para que elas cheguem, pelo menos assim descritas, em outros lugares onde haja a precisão de um pouco de quase nada para quem precisa de uma dose de delicadeza para enfrentar o mais que tudo.

Aquele que não pede licença nem permite outra opção a não ser enfrenta-lo com resiliência, coragem e (aí que eu entro) um sopro de humanidade e esperança de que as coisas, vagarosamente e com muito cuidado e zelo, podem, sim, melhorar...   


    

*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Da série “Não sei onde enquadrar” e do SEM FIM...  delcueto.wordpress.com

Studio na Colab55

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