domingo, 5 de dezembro de 2010

Joelho

Jo e

      l

      ho



Texto e fotoconstrução de Valéria del Cueto

Existem coisas na vida da gente que só damos a devida importância quando a perdemos ou danificamos. Vou citar dois exemplos: Joelho e unha. É sério. Alguém dá bola pros joelhos? A não ser que seja atleta ou religioso (lembrando que esse último anda em falta). Fora isso ele está lá. Faz seu papel obedientemente e pronto. Cumpre tabela.

A gente passa a vida ouvido recomendações sobre como tratá-lo. Entre elas, a de não andar na areia fofa ou inclinada e fazer aquecimento antes de se exercitar. Nada que mereça atenção na flor dos 20 anos. E depois, a gente meio que estaciona nessa “mentalidade”. E os anos passam.

Sempre tive o costume de me locomover pela areia, quando faço coisinhas no Leme, Rio de Janeiro. Escolho o ponto mais distante das tarefas e, para melhorar o dia, vou andando pela praia até ele. Depois, volto matando as missões pelas ruas internas de Copacabana. Ou vice-versa. Vou por dentro e volto descalça pela areia.

Foi numa ida que o joelho protestou. A dor foi atrás da rótula – sei que agora ela tem outro nome, mas a minha nasceu e se criou sendo rótula e se desintegrará um dia (espero que só depois da minha morte) se chamando assim – e foi intensa. Estava no meio do areal, numa parte em que a distância entre o mar e o calçadão é enorme, na altura do antigo Meridien.

Foi duro chegar a calçada, terrível o pensamento que imediatamente me assaltou. “Sem este joelho, como vou trabalhar no carnaval?” A extensão do estrago era imensurável, ampliando a péssima sensação que sentia, de que teria que sair dali com minhas próprias pernas e, consequentemente, joelho sem prejudicá-lo ainda mais.

Quando fui subir os degraus para chegar em terra firme, o bicho pegou de vez. Uma dor danada. Andando no reto, não sentia nada. Voltei pra casa e me esqueci do abacaxi até chegar as escadarias da portaria do prédio.

Não sou mulher de ficar postergando problemas. Por isso, imediatamente estudei as opções: ortopedista, acupuntura ou...

Bom, resolvi dar uma chance para as ervas brasileiras. Lembrei da máxima: “arnica por dentro e por fora”, de minha amiga L. ( não vou dar o nome completo pra não prejudicar a fada) que sempre tem uma erva no seu quintal mágico da Chapada dos Guimarães e é especialista em filho desmanchado pela bicicleta.

Na falta da planta para macerar com álcool e aplicar no local do estrago, entre arnicas industrializadas, tintura e pomada, encontradas nas redes de farmácias, optei por uma solução mais natural apelando para a farmácia de manipulação aqui do bairro.

Enfim, estou seguindo fielmente o tratamento. Gota a gota, quatro vezes ao dia, lambuzada a lambuzada, outras quatro no local prejudicado.

 Depois do “acidente”, recebi um convite que me faz, semanalmente, subir e descer várias vezes os quatro andares do barracão de uma escola de samba, na Cidade do Samba, aqui no Rio de Janeiro.  Haja joelho. Esqueci de contar que o problema é justo no joelho esquerdo e, como sou canhota, só começo as subidas com a perna esquerda. Então, sempre dói logo no primeiro degrau...

Doía, leitores, doía. Com duas semanas de tratamento e gosto de cânfora na boca, as coisas estão indo muitíssimo bem. Estou esperando minha mãe voltar de Búzios para me dar de presente uma joelheira, só por precaução e um pouco de charme.

Os efeitos do tratamento estão sensacionais. É claro que tive de reduzir um pouco a forçação, mas só nos primeiros dias. Estou evitando caminhar na areia – fofa - , porém já me aventuro a subir as escadas sem ter que parar para trocar o pé inicial costumeiro (como se fizesse muita diferença e o segundo degrau não forçasse o local machucado do mesmo jeito).

Mais umas semanas e  já poderei suspender o tratamento, bastando proteger o local com a joelheira prometida nos dias de muita ralação. Que falta fez meu joelho revoltado! A gente só dá importância para essas coisas quando se vê privado de suas facilidades, dizia eu no início do texto.

E as unhas, também citadas lá em cima? Você já perdeu uma unha, afinal, pra que elas servem? É, mais isso é assunto para uma próxima escrevinhação... 

* os joelhos retratados pertencem a minha sobrinha Luisa e Bruna, a prima mineirinha.

** Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte da série Ponta do Leme, do SEM FIM http://delcueto.multiply.com 

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