Segunda feira, 2 da tarde. Estou na Ponta. Ainda. Usando o meu biquíni mais antigo. Aquele que de topo de linha de alguns anos atrás virou diário, até ser substituído por outros que vinham na fila. Verdade seja dita, fui em busca desta peça antiga por razões totalmente justificáveis.
Quero me sentir em casa. No meu canto. Íntima. Usual, contumaz, tipo mobiliário permanente. Mesmo que, vez por outra, como agora, precise me ausentar.
A raposa que me habita palpita: “É, está ficando mais frio, o inverno está chegando”, me diz, tentando o quase impossível: transformar essa luz perfeita, este espaço aberto e o murmúrio do mar nas uvas verdes de La Fontaine.
Não cola. Quando estou quase convencida o barulho das bandeiras dos clubes, penduradas nas armações de lona dos barraqueiros, acrescenta um novo elemento aos sons - que penso conhecer de cor e salteado - da minha ponta de mundo. Se junta ao bater das asas de alguns pombos que se esforçam para alçar vôo, embalados pelo mesmo vento que cutuca as bandeiras.
Lá vai minha concentração - e quase concordância - no argumento do lado raposa, esmagada pela paisagem que me circula e o gemido do mar, acrescido dos elementos sonoros acima expostos.
Tá muito mar. Alto, mexido, cheio de valas e correntezas. Um surfista solitário espreita além da linha de espuma suja por causa da maré, trazida do outro lado da Pedra do Leme. Isso não é novidade.
Novidade vai ser o que a moça a minha frente vai sentir, quando descobrir, provavelmente num quarto de hotel, o estado lastimável das suas costas. Antes, branquinhas, agora, rosadas e mais tarde, num tom definitivamente vermelho.
Assim é a vida, uma troca de pele constante. Ás vezes traumática, como é o caso da moça. Outras, nem sequer sentimos. Mas elas, nossas camadas epiteliais, de uma forma ou de outra, se vão. Eu prefiro fazer minhas trocas de uma maneira intermediária, sem muito sofrimento, mas não de maneira que eu não note essa renovação.
Chico Amorim me ensinou a reconhecer o tempo da seca em Cuiabá observando nossas mãos descascar, sempre na mesma época do ano. Depois, a secura piorava castigando nossa nova epiderme e deixando ela no ponto para o tempo das águas... Mais ou menos como as pichações na Pedra do Leme, normalmente apagadas a cada início de ano para dar lugar... às novas expressões de uma, digamos arte, impressa no concreto do Caminho dos pescadores e adjacências.
Tudo isso, pra dizer que estou de partida. Outra vez. Um pouco mais tarde esse ano, porém, o tempo de ir apresentou-se.
E é de biquíni velho, alma lavada pela gratidão de aqui estar, que saboreio esse momento (que se repete muitas vezes na minha vida muito tempo), aquele em que digo a mim e a minha raposa: “A melhor coisa de ir, é poder voltar”
* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte da série Ponta do Leme, do SEM FIM http://delcueto.multiply.com
5 comentários:
esta bonito el lugar
“A melhor coisa de ir, é poder voltar”
volte...
Ainda não dá Leda, preciso reforçar meu caixa... mas até lá, virei novamente sócia da TAM, da Gol...
Ainda não dá Leda, preciso reforçar meu caixa... mas até lá, virei novamente sócia da TAM, da Gol...
Reproduzo aqui a mensagem que recebi de D. Elza, minha querida caçadora de formigas, enceradora de pisos e agora, plantadora de flores no jardim da Rua da Piscina, sem número:
"LINDA MARAVILHOSA!!!!!!!!
Valeria com seus olhos castanhos... seu biquíni e sua canga andando pelo quintal da casinha da Chapada... arrancando os matinhos que não acha graça e guardando os cipózinhos mais interessantes na varanda da churrasqueira onde uma majestade sabiá construiu seu ninho. Agora, Valeria, churrasco só depois de nascer os pequeninos....
Só quem viu sabe o que tem no pequeno paraíso de Valeria del Cueto..... Adoro aquela casinha, vou semear sementes de amor perfeito, a flor é linda!! Me autorize!!
Sua amiga Elza"
Gente, depois dessa declaração de carinho explícito, não posso negar nenhum desejado de Dona Elza!
AUTORIZO a senhora, querida amiga, a fazer o que quiser no paraíso que você me ajuda a tomar conta. A casa é nossa! Obrigada pelo carinho.
Postar um comentário