Só acaba quando termina
Texto e fotos de Valéria del
Cueto
Não
espere mais nada de mim. É tudo que tenho para dar. Tento me reconectar a vida
depois de mais um carnaval. Procuro fios que me interliguem ao espaço que volto
a ocupar.
O
barulho da água que despenca do desvio do rio na piscina pode ser um desses
fios. O ruido sempre foi um seletor de pensamentos que reproduzo aqui no
caderninho quando junto a contemplação dos movimentos do reflexo na água. Faço
dessa dança uma peneira que afina e conduz as ideias tramadas nessas páginas.
Tento,
tento, tento... sem muito sucesso.
O
João e a Vânia, meus senhorios no paraíso, inconscientemente fazem parte desse
esforço. Ele, quando me apresenta uma frutinha que nunca vimos chamada
cauá-piri, ou cauá-pixi ou moranguinho do mato. É rasteira e fotogênica.
Pausa.
Tempo de pesquisar para descobrir do que se trata, já que seus frutinhos
minúsculos vermelhos se destacaram no chão embaixo da jabuticabeira e, segundo
João, as sementes podem ter sido trazidas pelos passarinhos que fazem suas
refeições nas árvores brasileiríssimas.
Vania
contribuiu me apresentando mariolas deliciosas de uma marca que não conhecia e
balas Toffee recheadas de creme de hortelã. Ajudam no regime de engorda para me
recuperar um pouco do desgaste físico da Sapucaí.
Mas...
falar de mariola me leva novamente à pista. Acontece que a delícia fluminense
(as de Rio Brilhante são sensacionais) faz parte do kit alimentação especial
das noites e madrugadas carnavalescas.
Ele é
composto de sanduíche de queijo, as mariolas sem açúcar cristal em volta, pra
não piorar a lambança na pausa embaixo do segundo módulo de julgadores em que
costumo descansar entre uma escola e outra, se não estiver encarapitada na
torre de transmissão.
A
matula também contém sementes de guaraná maués, um quente, pra fechar o rebite
e água, muita água.
Então,
mariolas me transportam, mas não me levam a sair da realidade já passado do
templo do samba...
O
que, de uma certa maneira, é bom devido a etapa do trabalho que vem depois da
folia: editar os registros que fiz.
Uma
tarefa que exige atenção e paciência. Ouvir os sambas da escola que está sendo editada,
decupada e indexada comendo mariola torna o ambiente perfeito para mergulhar na
missão.
Confesso
que faz tempo desisti de participar da competição de quem publica mais rápido
seus registros. Essa edição fina e a catalogação do acervo carnevalerio.com me
tiram dessa animada e salutar disputa entre os fotógrafos. O que, de certa
maneira, interferiria no resultado do material que disponibilizo nas plataformas.
Sem
alarde o conteúdo vai sendo construído ao longo dos anos. É interessante o
resultado? Sem dúvida. Depois da indexação as imagens ficam disponíveis publicamente
em baixa resolução no Flickr.
Já
estou no carnaval de novo! E, dele, não consigo largar.
Parei
para dar um mergulho e, pra não perder a mão, fazer umas fotos das flores de
São Miguel que estão explodindo na borda da piscina.
Quando
chego perto “pesco” a iluminação sutil que o reflexo da água faz no carro
alegórico de florezinhas azuis que saltitam ao vento da Mata Atlântica.
E aí,
pra não perder a mão, o lado do meu eu carnavalesco pergunta ao outro, que
tenta se situar no meio do mundo do ano que se inicia:
“Será
que num carnaval do futuro os iluminadores aprenderão a fazer uma luz tão
delicada e sutil quanto essa, gerada pela natureza?”
Desisto
do diálogo de mim comigo mesma e vou editar. Afinal, como a vida, o carnaval só
acaba quando termina...
*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Da série (ainda) “É carnaval” do
SEM FIM... delcueto.wordpress.com
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