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terça-feira, 14 de abril de 2020

Que mundo é esse?

Que mundo é esse?

Texto e foto de Valéria del Cueto

Querida cronista estou aqui, mais uma vez, para dar notícias do lado de cá. Falo dessa maneira porque não posso dizer que seja um informe do seu mundo. Aquele que, sinto comunicar de supetão, não existe mais!

Para situá-la, lamento dizer que não escrevo do lugar de sempre. Troquei a ponta do Arpoador, agora inacessível, pelo telhado de um prédio próximo.

Não está entendendo nada desse relato, não é? Nem você nem os bilhões de habitantes desse planeta que, egoistamente, todos se acostumaram a chamar de SEU. Concluo diante do que tenho visto que esse sentimento de posse pode ter sido uma das causas das atuais circunstâncias, as que tento relatar. Sei que a narrativa deve estar gerando confusão. Mas a vida é assim, como no futebol, uma caixinha de surpresas. E as últimas têm sido estarrecedoras.

Definitivamente, meus estudos interplanetários de extraterrestres de passagem indicam que por se achar dono do mundo o ser humano, que idiota, pensou que poderia fazer gato e sapato do planeta. Tanto tentou e cutucou a onça com vara curta que o felino se irritou e resolveu reagir a altura.
Eu, que bati nesses costados na minha missão de explorador das galáxias e vi minha nave.

interplanetária não ter potência para sair da armadilha atmosférica da detonada e maltratada camada de ozônio, eu, amigo confidente e correspondente dessa cronista enclausurada por vontade própria do outro lado do túnel, tenho a triste e frustrante missão de informá-la pela fresta de luar que invade sua cela que nem os alertas dos cientistas, nem meus avisos desesperados surtiram qualquer efeito para impedido o desastre. O mundo acabou!

Seu fim veio de forma invisível e silenciosa. Ao contrário de todas as previsões não houve maremoto nem terremoto. Não foi pelo fogo, pela água ou pela seca.

Foi, simplesmente, pelo alastramento de um vírus mutante capaz de dizimar parte da população. Tirando em poucos dias a capacidade das pessoas respirarem! Começou na China, passou pela Itália e se espalha por todos os continentes.

Sei que você deve estar pensando que este quadro é fruto da minha imaginação, provocado pelo uso experimental desses alucinógenos que, você sabe, andei testando nas minhas andanças... Gostaria que fosse isso. Pelo bem dessa humanidade que, perplexa, hoje se esconde em suas casas, estoca alimentos e se comunica pelas redes sociais esperando um milagre da ciência.

Os governos que não acreditaram na potência e na letalidade da Covid-19 (é assim que essa variante do coronavirus se chama) estão pagando um preço altíssimo e, acredito, ainda serão responsabilizados criminalmente por suas escolhas equivocadas na condução desse “processo”.
Cronista querida, aqui no seu país os governantes no início da pandemia estavam preocupados sabe com o que? Como o mercado! Como se o “Deus” do capitalismo fosse capaz de evitar a quebra de todos os paradigmas sociais e econômicos do mundo inteiro!  Quanta ignorância...

Além disso, para piorar a situação, um louco desequilibrado conduz o Brasil num momento dramático como esse. Ele diz que o evento que paralisou o planeta, impedindo a circulação de pessoas, a aproximação entre os humanos, separando famílias por causa do seu incrível grau de contágio e letalidade, é apenas “uma gripezinha”.

Abraçar? Não pode. Beijar? Nem pensar. Tocar? Transmite o vírus. Os costumes mudaram, os valores também. Mas o delirante mandatário contraria todas as normas e cuidados definidos por quem está no meio da tempestade viral tentando conduzir o barco.

Lá, no resto do mundo, fronteiras foram fechadas. É terminantemente proibido sair às ruas a não ser para comprar comida, remédio ou procurar ajuda médica. Só serviços essenciais funcionam. Sistemas de saúde entram em colapso. Sem mencionar as mortes velozes, os corpos cremados ou enterrados sem velórios, quando não ficam abandonados nas habitações para serem recolhidos.

Enquanto isso aqui, até em rede nacional, se incentiva o povo a não respeitar o isolamento social necessário para refrear o avanço da calamidade em larga escala.

Cronista, sinto informar, mas é tudo verdade! E, com essa forma empírica que adotei de me fazer humano por osmose nessa missão intergaláctica interminável aqui na Terra, descobri um sentimento terrível até agora desconhecido. O medo.

Foi ele que me trouxe a este novo cenário, o telhado. Único lugar em que alcanço a luz do sol e vejo, ao longe, seres humanos em suas enclausuras.

Para terminar, uma esperança. Essa que segue, valente, imune ao vírus. Com a paralisia compulsória, poucos veículos circulando, com o colapso econômico e o recolhimento social, a Mãe Terra se recupera das agressões cotidianamente provocadas pelos humanos. A poluição diminui, o mundo respira e conspira por uma mudança radical de comportamento.

Em resumo, enquanto castiga severamente seus algozes, o planeta agradece a pausa obrigatória e se regenera.

Fico por aqui. Gostaria de estar ao seu lado, dando maiores esclarecimentos sobre os fatos relatados. Mas, para sua própria segurança, prefiro me manter afastado procurando, junto com muitos outros valorosos cientistas, uma forma de ajudar na preparação para o novo mundo que surgirá. Espero que em breve...

Saudações do seu extraterrestre e confidente, Pluct Plact.

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “Fábulas Fabulosas”, do SEM   FIM…  delcueto.wordpress.com
Studio na Colab55

sábado, 29 de fevereiro de 2020

De alma lavada Viradouro leva o ouro

Ó mãe! Ensaboa mãe! Ensaboa pra depois quarar...
As Ganhadeiras de Itapoã deram o título à Viradouro.

Texto e fotos de Valéria del Cueto
A Viradouro levou o título de campeã do Grupo Especial do carnaval carioca de 2020 correndo por fora durante a maior parte da apuração. Foi a segunda agremiação a desfilar no domingo de carnaval (nunca uma escola nessa posição havia conquistado o título). Desde “É Segredo”, da Unidos da Tijuca, há dez anos, ninguém chegava ao campeonato no primeiro dia de desfile! O primeiro e único título da escola de Niterói havia sido em 1997 com o enredo “Trevas! Luz! A Explosão do Universo”. Depois de passar por um rebaixamento, ano passado e vermelho e branca quase chegou lá, sendo vice-campeã.

Impossível se mensurar em 2020 uma unanimidade entre as preferidas para chegar ao título. Claro que o quesito verbas públicas pesou - e muito - na balança da finalização dos projetos. Entre o primeiro e o quarto lugar, três escolas eram de municípios da região metropolitana do Rio que subvencionaram suas “filhas”. A campeã, Viradouro, de Niterói, a vice Grande Rio, de Duque Caxias, e a quarta colocada, a Beija-Flor, de Nilópolis.

A força religiosa na estética dos carnavalescos estreantes Leonardo Bora e Gabriel Haddad.
Outro ponto interessante é que a campeã, com Marcos Ferreira e Tarcísio Zanon, e a vice, com Leonardo Bora e Gabriel Haddad, apostaram em carnavalescos vindos do Grupo de Acesso. A iniciativa indica a renovação dos criadores e gestores e, também, uma questão econômica se considerarmos que seus valores não eram tão elevados quanto os do mainstrean da categoria. E onde esses foram parar? Em São Paulo...

Foi por isso que Paulo Barros, depois de chegar ao vice-campeonato na Viradouro em 2019, não continuou no projeto esse ano. Para fazer a Gaviões da Fiel, em São Paulo, trocou a escola de Niterói pela Unidos da Tijuca. Se deu mal lá quase sendo rebaixado. E aqui amargou um 9ª lugar.

Imagem icônica e controversa da verde e rosa, o Cristo Moleque Pelintra.

DESFILE DAS CAMPEÃS
O “Jesus da Gente” da Mangueira por pouco não volta nas campeãs. Ficou em sexto e é a primeira agremiação a se apresentar. Apesar do excelente ensaio técnico no teste de som e luz o samba não empolgou na avenida. A verde e rosa volta disposta virar o fio de sua performance e mostrar aos 70 mil espectadores na Sapucaí (os ingressos já se esgotaram), que “A verdade vos fará Livre”. Em tempo: o carnavalesco Leandro Vieira está em busca da sua “verdade” nos próximos dias. Precisa escolher entre continuar na Mangueira onde já tem 2 títulos nos últimos 4 anos no Especial, ou “subir” com a Imperatriz Leopoldinense com quem foi campeão do grupo de Acesso esse ano.
[caption id="attachment_6336" align="aligncenter" width="1080"] Animadíssimas as componentes do carro cigano do Salgueiro.[/caption]
O circo do Salgueiro tão lindo, pouco falava de Benjamin de Oliveira, o palhaço negro homenageado. Mas nos quesitos plásticos foi imbatível. Com o quinto lugar será a segunda escola a se apresentar. Destaque para Marcela Alves e Sidcley, casal que alcançou os 50 pontos no difícil quesito de mestre-sala e porta-bandeira.  Também chegaram a nota máxima os casais da Viradouro e da Grande Rio.

vO carro mais alto da Beija-Flor emoldurado pela Apoteose.
Em quarto lugar a Beija-Flor é a terceira a entrar na Sapucaí. Destaque para a comissão de frente Mad Max ambientada num ferro velho numa esquina qualquer da baixada fluminense em que reina a entidade da rua no enredo “Se essa rua fosse minha”. E, também, suas maravilhosas baianas.
Ricamente vestidas, as baianas da Beija-Flor.

A homenagem à Elza Soares da Mocidade Independente de Padre Miguel, por incrível que pareça, perdeu pontos no quesito bateria. Algo no desenho da “Não Existe Mais Quente” tirou a escola da briga pelo campeonato.  A comissão de frente que retrata a vida da cantora e utiliza holografia chamou a atenção, além do samba, um dos preferidos pelo público. Em terceiro lugar, desfilará na quarta posição da noite.
Na Mocidade Independente de Padre Miguel o casal e o abre-alas.

O mítico babalorixá Joãozinho da Goméia quase levou o título inédito para a Grande Rio, de Duque de Caxias. Penúltima a desfilar, a vice campeã embalará os versos “eu respeito seu amém e você respeita meu axé”, pedindo tolerância religiosa.

A explosão de cores e efeitos de água na Grande Rio
A escola, que vinha liderando a apuração, perdeu o título nos dois últimos quesitos, evolução e harmonia. Diz a lenda que foram penalizados por um enorme buraco provocado por um destaque que chegou atrasado e exigiu ser colocado em posição pelo Carvalhão, o sistema de elevador/guindaste, em vez de subir de escada. É a síndrome do ou da “quem”, em excesso na agremiação.
Na comissão de frente, Oxuns e no fundo das bacias...

A noite termina embalada pelas Ganhadeiras de Itapuã, interpretadas por Zé Paulo Sierra. Devagar, devagarinho, a escola deu uma pernada nas co-irmãs justamente nos quesitos finais, fluindo na Sapucaí abençoada por Oxum e a sereia de seu abre-alas. De alma lavada, seus componentes ensaboarão a Marques de Sapucaí em mais um enredo que fala de mulheres excepcionais. As que, com seu suor e cantando suas histórias, ganhavam dinheiro para libertar os escravos na Bahia.

Sem grandes patrocínios, o carnaval de 2020 chamou a atenção para diversas questões intimamente ligadas ao povo do samba. A intolerância religiosa, a violência, as necessidades populares, como habitação. Tudo isso coroado pela força das mulheres, as Elzas e Ganhadeiras de Itapuã que estão no meio de nós.

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “É carnaval”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com
Ordem dos desfiles:
Mangueira
Salgueiro
Beija-Flor
Mocidade
Grande Rio
Viradouro

Studio na Colab55