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domingo, 7 de dezembro de 2014

Pau na mula que a coisa é chula

Araras 140927 057 Mata Atlântica floresta
A floresta está uma mixórdia depois das últimas eleições. Mas isso é letra morta diante dos últimos acontecimentos. Depois de prometer, ameaçar, difamar e descumprir o prometido (a novidade – sempre há – é o tempo recorde das “ações” acima citadas) no período eleitoral, os donos da floresta devastada e ameaçada por sua própria corja, estão brigando entre eles e com toda a população adjacente. Uma loucura!
No meio disso, os preços dispararam, a indústria florestal parou, os investidores externos picaram a mula (que não são bestas) e os internos agora são taxados (que injustiça!) de propineiros e corrompedores ativos e passivos. Foram delatados por penas menores pelos operadores do sistema de arrecadação implantado pelos abutres quando pegos com a boca na botija. Deu pra entender?
O rolo começou na Carboflora, mundialmente conhecida e, até então, respeitada. Durante o período eleitoral a anta  usou a frase preferida do seu guru crustáceo: “eu não sabia” para negar o óbvio. Depois, a coisa saiu do controle e, pra livrar seus próprios rabos, os repteis da alta cúpula nas negociatas não apenas abriram suas bocarras, mataram a cobra e, pra não haver dúvidas, mostraram o pau. Quer dizer, as atas da ladroagem. Virou foi bola de neve! Aí apareceu uma correspondência que invalidou o “eu não sabia” da anta. A coisa se alastrou como “o nunca antes na história dessa floresta”...
Os habitantes da floresta ficaram pasmos! Ainda mais quando descobriram que os esquemas alimentaram doações oficiais da campanha vindas diretamente da fonte patrocinadora, no caso, dos encarregados das obras de melhorias do habitat natural dos animais. Aquelas que raramente ficam prontas apesar de aditivadas e, antes mesmo de concluídas, são condenadas por “mal feito” elaboracionais e executivos.
As notícias dão conta que o sistema alimentador do propinoduto está implantado em todas as ramificações e trilhas da floresta. Tudo é uma questão de seguir os mestres delatores, suas informações privilegiadas e devidamente documentadas para fazerem parte da contabilidade fraudal. O negócio é muito organizado...
Parece que não vai sobrar pedra sobre pedra! O que por lei impediria, inclusive, que as maiores obreiras  possam continuar suas empreitas florestais. Formiga, João-de-Barro e outros construtores tradicionais estão todinhos na pica do Saci, enquanto as cigarras cantam no calor das delações!
E não para por aí. Há mais entraves, esses resolvidos na plenária dos representantes da fauna para fazerem suas leis. Acontece que a anta, por não conseguir fazer dois mais dois serem iguais a quatro, resolveu mudar as regras da matemática financeira da floresta pela qual, quem não conseguisse chegar ao resultado correto deveria ir para o xilindró da economia.
Resultado? Quem tá junto, no caso a maioria, seguindo seus líderes, foi cooptado para mudar o que está escrito e, pior ainda, retroceder no absurdo.
A minoria - tucanos e outros animais não alinhados - se revoltou fazendo um alarido danado usando todos os meios regimentais para adiar e impedir o descalabro. Não teve jeito! De tanto ouvir “apartes” e “pela ordem” o pica-pau que conduzia as sessões quase perdeu seu novo topete, fruto de um implante, quando para – literalmente - esfriarem as discussões, a temperatura do recinto foi baixada para um grau quase glacial. Tudo para calar a oposição...
A votação da “antagonia”, a economia criativa animal, já estava garantida. O martelo do vale tudo fiscal foi batido com um “in$entivo” por decreto e condicionado a aprovação da mudança instituindo: “2+2=5 na floresta. Um agradinho de mais 750 mil em emendas para cada piada a favor. Uma bagatela de 444 milhões.
Mas cá entre nós (e os botões dos capotes usados para espantar o frio da sessão histórica) diante dos bilhões surrupiados, o que significa essa merreca animal?  
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Fábulas fabulosas”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com
GRAVATA 
Formiga, João-de-Barro e demais construtores tradicionais da floresta estão todinhos na pica do Saci enquanto as cigarras cantam no calor das delações
ILUSTRADO TER A A S BADO     NOVEMBRO  2009

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Quem tece teias, encera a vida


Quem tece teias, encera a vida

Texto e foto de Valéria del Cueto

Quando você ler esta narrativa, o que agora escrevo e descrevo, estarei a milhares de quilômetros da minha realidade atual: uma canga (sempre ela) estendida no gramado dos fundos do chalé onde descanso do trabalho, nos finais de semana.

O vento balançando a gigantesca mangueira em plena floração, enche o espaço de micro florezinhas. Este perímetro, aí incluindo meus cabelos  já salpicado de florinhas, é todo delas que também se abrigam na costura do caderno onde escrevo agora (e quase sempre) e até na a teia de aranha, construída na grade verde que protege a porta da cozinha.

Há alguns finais de semana que acompanho a construção dessa teia, torcendo para que dona Elza não passe por aqui com sua vassoura, o que agora, com a quantidade de florezinhas presas nas garras da aranha-mor, não vai demorar para acontecer. Na verdade, a teia só sobreviveu a faxina semanal por que vim mais cedo pra Chapada dos Guimarães essa semana e atrapalhei a concentração de Dona Elza jogando conversa fora, pra variar. Assunto entre nós é o que não falta.

Desembarcamos na casa da beira da piscina mais ou menos ao mesmo tempo. E, desde então, ela tem sido uma guerreira no combate as formigas que, se achando as donas do pedaço, se abrigavam em lugares tão incríveis quantos o piso de madeira da sala, o canto do sofá, o estrado da cama de casal e, pasmem, dentro da esquadria de metal da porta principal.

Uma loucura. A casa estava fechada e, pelo sim, pelo não, por que não ocupa-la, como a tudo em volta? As formigas da Chapada são cascudas. Poderosas. E é aí, no quesito “caçadora de formigas”, que dona Elza faz o maior sucesso. Sua especialidade é acabar com a mordomia das meninas, garantindo um espaço pra mim no mundo maravilhoso da casa da rua da Piscina, sem número.

Sei que ganhei uma amiga e cúmplice no longo trabalho de cuidar não só da casa, mas de todo o terreno que me cabe no meu reino de final de semana. E não vai ser pouco o trabalho já que eu adoro brincar de casinha e dona Elza já me confessou que se apaixona pelas casas que cuida, mais que pelos moradores. E não é que após dois meses a diferença já é gritante?

O todo esse esmero me remete para minha infância. Acontece que parte do piso da sala e do espaço onde vejo vídeo e escuto música é de madeira. Quando assumimos os trabalhos no local, essa parte estava bem castigada. Os olhos de Dona Elza brilharam quando viu o tal piso e ela logo me disse que ia deixá-lo impecável. Não demorou muito. Quando abro a porta, na sexta feira, no final da tarde, sempre reparo no capricho do lustre, fruto de muita cera e esfregação. Igualzinho a casa onde fui criada, no Leme. Só que em proporções reduzidas, é claro.

E aí, volto no tempo. Lembro de Dona Ena, minha avó, dando altas broncas, por que a criançada corria pelas salas e corredores, detonando com os sapatos o latifúndio, arranhando os tacos recém encerrados. Era uma enxugação de gelo danada, querendo que nós, as três pestinhas de plantão, resistíssemos a correr – e muito – pela vida da família que habitava o apartamento do Leme.

O bom é que minha avó dava as broncas e procurava sempre um meio de “solucionar” o problema. No caso, ela acabou criando uma nova modalidade de brincadeira para dias de sol e chuva. Tirou de um armário um antigo vestido de não me lembro quem, que tinha camadas um tule cor-de-rosa na saia e fez uns sapatos, ou botas, de acordo com a preferência de cada neto, pra gente.... patinar pelo apartamento. Resultado: a brincadeira pegou, e o piso ficava um brinco. Brilhando como nunca pelo nosso efeito enceradeira.

Pois agora, anos luzes depois, quando entro na casa da Chapada e vejo o brilho do piso, sou atirada no túnel do tempo. Aliás, o zelo com o tal piso faz com que cada vez que chego dos passeios de bicicleta pelas redondezas e penso em atravessar este espaço, tão bem cuidado, para recolher meu imóvel andante, eu acabe chegando ao cúmulo de carregar a bicicleta para que suas rodas, cheias de lama ou de terra, não deixem seu rastro no piso de tábua corrida. Vai que Dona Elza seja tão boa de bronca como minha avó!

Pois é por causa de tantas e tão boas lembranças que informei lá em cima que quando estiver lendo esse texto, estarei tão longe. Vou ao encontro das minhas melhores recordações e motivações, rever o que me faz ser mulher o bastante para partir pra qualquer desafio. Meu ponto de referência, meu porto seguro.

E, na Ponta do Leme, ouvindo o barulho do mar batendo no Caminho dos Pescadores estarei lendo, como você, a história que, ao narrar, perpetuo.    Afinal, cada um, assim como a aranha que habita a grade da porta, tece a teia que pode e merece. A questão é saber o que vamos recolher nela:  alimento e nutrição, ou simplesmente florezinhas intrometidas de uma mangueira abusada, sacudia pela ventania, numa tarde amena do centro oeste. Bom dia pra você!

* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte de uma série do SEM FIM