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sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Pipas, pra que(m) te quero?

Pipas, pra que(m) te quero?

Texto e fotos de Valeria del Cueto

Leves, alegres, saltitantes, preguiçosas, tensas, persuasivas, suaves, nervosas, agitadas, mansas, fugitivas, alegóricas, coloridas... Pipa  é  um substantivo capaz de comportar uma penca de adjetivos para definir seu espírito vigente, de acordo com o vento que a sustenta. Venho de um lugar de muitas pipas que, assim como as ondas do mar  deste local, são originais, fugazes e perenemente inéditas a cada movimento.

Chame do nome que quiser: pipa, papagaio pandorga... Elas são para quem te quero.  Mensageiras do amor e da dor. Para isso nasceram. Da dor quando servem de sinalização para o movimento das bocas e bandos. Do amor quando sobre a céu as milhares,  como aconteceu na Faixa de Gaza há poucos dias. Um objeto tão simples, tão frágil representando tanto. Poderoso e expressivo, como a paloma de Picasso há tantos anos atrás.

Bambu, seda, farinha, água e a linha. O milagre está feito. E se repete, numa resistência silenciosa pelos  “aís” onde passo. Uruguaiana tem o Julinho das Pipas que, entre um conserto de bicicleta e outro (olha a bicicletaria aí, gente!), encanta a garotada e transmite seu saber às gerações.  O Tribuna de Uruguaiana publicou uma matéria sobre ele, o que me fez enredar essas narrativas.  

Cuiabá tem o professor Ditinho que da UFMT expande seus conhecimentos pipeiros. Morador da Chapada dos Guimarães, lá estava ele no Festival de Inverno com sua oficina.  Tentei inscrever-me, mas acabei perdida, sem saber direito os horários. Conversando com uma organizadora das atividades soube que a oficina aconteceu num bairro periférico. Adorei a razão do desencontro.

Vamos espalhar pipas pela cidade, pensava eu. Colorir o céu da charmosa localidade com pandorgas “made” in Chapada, como um plus a mais para a Copa de 2014.  Ela vai acontecer na época dos melhores ventos, me contaram. 

Gente  que entende do assunto, freqüentadores da loja de pipas e infláveis que ilustra esse texto. Fica na mesma rua da bicicletaria, na Chapada. Lá se vende pipas, acessórios e se faz consertos. Quer um lugar mais adequado para uma piparada no mega evento?

É um programa bom, bonito e barato. E, muito importante, a bula deste produto não contém contra-indicações.  É politicamente correta e ambientalmente irrepreensível. Não causa danos nem efeitos colaterais.

Estaríamos fazendo nossa interpretação de uma arte difundida pelo mundo inteiro. Pipas chinesas são famosíssimas , o caçador de pipas corria atrás da sua pelas ruas de Cabul, a Faixa de Gaza levanta 3.000 papagaios e a Chapada dos Guimarães dialoga com o mundo através dos ventos que sopram nos paredões do centro geodésico.

Confesso a vocês que tenho uma frustração quando o assunto é pipa. Almejei, um dia, uma pipa. Essa, não era para voar. Trata-se de um exemplar (qualquer um serviria) da série feita pelo artista plástico mato-grossense Gervani de Paula. Vi os objetos do meu desejo numa exposição, na década de 80, e na ocasião não tive numerário para adquirir uma das peças. Anos depois, tentei descobrir o destino das pipas do Gervani. Estavam em coleções e eram intocáveis. Como seria a minha, se a tivesse...

O desejo teve que passar e, meu lado Poliana, me convenceu que pipas são assim. Dificilmente vêm pra ficar. Temos as nossas, podemos admirar as alheias  mas, ambas, dificilmente voltarão a se encontrar no mesmo céu. Seja ele qual for...

* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte de uma série do SEM FIM delcueto.wordpress.com.

 **Mais pipas na vida da autora no artigo "A pipa", publicado em maio de 2005. 

*** Se der uma busca no Sem Fim... encontra outros textos sobre pipas.