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sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Balança do tempo

Balança do tempo 

Texto e fotos de Valéria del Cueto

Bora lá que está enrolado fazer esse texto. De vez em quando é assim. Algumas vezes falta assunto. Mas, no caso, o problema é outro. Excesso de possibilidades. A coisa se complica quando houve uma promessa de ir numa linha e a vida te leva para outro lado.

Esquece a política bombada e reverberada na véspera da eleição. Em que o tudo ou nada vira um vale tudo insuportável de estratégias, abordagens e ataques milagrosos prometendo garantir o resultado que, nessas alturas do campeonato, ninguém pode prever.

Nada de comentar as escolhas dos sambas enredos, especialmente a da Mangueira e o reencontro com ritmistas e a diretoria da bateria. Primeiro, no sábado da última eliminatória. Depois, no ensaio das composições que chegaram a semifinal e o cantor oficial da verde e rosa, Marquinho Art’Samba.

Fotos, muitas fotos e alguns vídeos(zinhos) que farão a alegria de quem gosta de estudar o ritmo, suas bossas e viradas. Sai de mim, tentação!

Prometi e vou cumprir! Sigo passeando por Mato Grosso do Sul, procurando assuntos e imagens que interessem a você, leitor querido. E lembro que estamos só no início da jornada...

Falemos de mala. E de como sobreviver em uma viagem de menos de um mês com alterações de temperatura inimagináveis. De 01 (zero um) a 40 (quarenta) graus, rolou de tudo. Inclusive um vento constante para diminuir ainda mais a sensação térmica. Quanto mais para o sul, mais baixa a temperatura.

Ponta Porã foi recorde. E, no dia mais frio, para coroar fui para uma chácara fora da cidade. Com um nevoeiro clássico proporcionando uma imagem representativa do alcance visual da tarde da visita. Registrei da frente da casa, um pouco além da varanda. Foi o máximo que consegui chegar. Voltei correndo pro pé do fogão a lenha que aquecia a sopa deliciosa feita por Anapaula Pissini. Querem fotos da delícia? Leiam a crônica anterior, “Medidas compensatórias”. Ela explica por que não tem. Sopa, gente! Esfria...

Deu pra sentir o guarda-roupa necessário para enfrentar essa “friaca”? Sobre pele, camisa de malha, camisa de flanela, blusão quentão com capuz e cachecol enrolado por dentro. Meias, jeans e botas de cano longo. Bota na mala.

Pensar que uma semana antes ainda em Campo Grande e morrendo de vontade de sentir o ar campeiro, desembarquei direto na Acrissul, para ver uns exercícios da Escola de Equitação Montana.

Um fim de tarde dedicado a afinar o olhar mirando nos alunos que treinavam movimentos com seus animais, sob as orientações de Camila e muitos tererés para refrescar o calor que fazia na capital de Mato Grosso do Sul. Para quem saiu do Rio em busca de temperaturas amenas. Errei feio...

Dias depois fui conhecer a Fazenda Santa Anita, perto de Campo Grande, em busca do cenário perfeito para a gravação das imagens do DVD da dupla “Maria Clara e Camila”. Mais tereré num ambiente rural, apreciando o por do sol e ouvindo a sinfonia de passarinhos conversando entre as árvores que emolduram a paisagem vista da casa principal.

Os sons da cidade foram substituídos por uma variedade de pios e trinados enquanto o céu ganhava aquele tom laranja, se avermelhando e, finalmente, deixando a noite abraçar o horizonte, fazendo desaparecer as árvores que criavam o contraste com a circunferência flamejante do astro solar. Não havia ainda a camada de fumaça que “nublaria” Campo Grande quando passei lá no final da viagem.

E voltamos para a mala. Do frio ao calorão, com todos os apetrechos necessários para a aventura.

Com direito a compras (poucas, o dólar estava nas alturas) na fase mais “puxada” do frio. Afinal, de roupa de verão o Rio bate um bolão. Nunca ultrapassou o peso máximo do volume admitido pela companhia aérea. Mas, confesso: agora quando fico na dúvida entre uma peça e outra, me baseio no peso. A mais leve será a escolhida.

Assim como com os candidatos (que ainda não defini) nessa eleição. Do mais leve será o meu voto. Por isso, pela minha balança do tempo só tenho uma certeza... #ELENÃO

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “Fronteira oeste do Sul”, do SEM FIM...delcueto.wordpress.com
Studio na Colab55

quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Logo ali

Logo ali

Texto e foto de Valéria del Cueto

Fiz que fui, quase fiquei mas, para felicidade geral, acabei indo. A vida é uma partida de futebol interminável incluindo os deslocamentos pelo campo que é esse mundão de Deus. Como todo bom jogador completo vou para onde o técnico manda. Porém, confesso, tenho minhas preferências e, quando posso, faço escolhas próprias baseadas em algumas variáveis.

Adoro ir onde o vento leva. Mas hoje, além do bom tempo, sigo as correntes dos preços das passagens aéreas, as cotações das moedas de países da lista de desejos e outros critérios mais objetivos do que gostaria esse ser viajandão.

Reconheço que em alguns momentos apago as prioridades e tomo um rumo certeiro por exigência de sobrevivência do equilíbrio básico necessário para fortalecer meu eu interno. Aí, troco o oceano de água salgada por um imenso mar de água doce no centro do continente sul americano. Nele, me dispo das camadas do convívio ligeiro e superficial para encarar o mais difícil e complexo personagem do repertório da vida: ser eu, apenas eu.

Tá, já sei sua pergunta: “o que a água doce te dá que a salgada não te traz?” A resposta é dolorosa, mas real. Entre outros benefícios, a segurança.

Na minha praia carioca todos os sentidos têm que estar alertas. Mesmo em momentos como esse de concentração literária. Tudo pode acontecer e, das duas uma, ou vira crônica ou motivo de, com toda a agilidade disponível, levantar acampamento e seguir outro destino.

Foi assim, quase traumática, a última experiência no Arpoador. Do luxo ao lixo em poucos e preciosos minutos. De uma crônica inspirada sobre o paraíso  “Quase perdido”, a ser testemunha involuntária de uma barbárie oficial no horário nobre do por do sol mais famoso do Rio de Janeiro, talvez do Brasil, quiçá da América do Sul. Tirei de letra a crônica da felicidade e registrei em vídeo a violência oficial da guarda municipal, cotidiana e banal na cidade partida.

No impacto dos acontecimentos concluí que era hora de trocar o tempero das águas cariocas por correntes menos imprevisíveis. No “unidunitê” dispensei os “salameminguês” e usei um critério climático para cravar o novo destino.

Na dúvida, entre o Pantanal de Mato Grosso e o irmão do sul o segundo levou a melhor. Nele, como em todo nosso Centro Oeste agro pop, a umidade do ar está um pouco mais relativa e amigável. Volto às origens, agora partidas, de uma terra especial que (re)conheço desde criança. Fugindo da secura caí para o oeste e para o sul.

Do alto da serra de Maracaju vislumbro o doce mar que tanto anseio. Quero o silêncio barulhento das águas, da terra e dos animais para substituir as batidas das paredes sendo derrubadas nas múltiplas reformas do meu quadrado copacabanense. O sussurrar das folhas ao vento ao invés do som do corte do esmeril que entra pela janela transformando meu pequeno mundo numa cadeira de dentista com a broca indo e vindo 8 horas por dia.

Não, não é aqui no avião que atingirei o nirvana. Pelo menos no trecho Rio-São Paulo. No agradável trajeto uma menininha de uns três anos resolveu decretar o apocalipse e, da decolagem ao pouso, berrou delícias a todo pulmão do tipo: “Estou com meeedo”, “Balançoou...”, “O avião vai cair...”.

Tirando a gritaria em si, nada disso me abala, mas pegou na veia de outros passageiros que, de tanto aguentarem a ladainha desesperada da pequena, foram emprenhados pelo ouvido e, apesar da tranquilidade do voo, resolveram distraí-la. Adiantou? Não.

Os excelentes pais sem domínio sobre a cria deixaram o tumulto correr frouxo. Nada que meio Dramin, para fazer a malinha sem alça e sem rodinhas descansar, não resolvesse. Ou um pouco de autoridade familiar. Mas aí também era querer demais... Melhor abstrair e ignorar as expressões da metade dos passageiros enfurecidos e incomodados. Eles que se mudem! Mas para onde?

Foi a última prova antes de alcançar o nirvana que buscava. Duríssima! Não sucumbi e resisti. Agora, estou no trecho como gosto. O paraíso é logo ali...

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “Fronteira oeste do Sul”, do SEM FIM...delcueto.wordpress.com


Studio na Colab55

quinta-feira, 19 de abril de 2018

Pedra Azul, a joia capixaba

Pedra Azul, a joia capixaba

“Point” do Espírito Santo une tradição, modernidade e sofisticação

Texto e fotos de Valéria del Cueto

Pedra Azul é a Campos do Jordão do Espírito Santo e sua completa tradução mineral um dos cartões postais do estado. Parte da região, belíssima, abriga o Parque Estadual que leva seu nome. Fica no distrito de Aracê, do município Domingos Martins.

Depois do desembarque no recém-inaugurado aeroporto da de Vitória e fazer um tour pela arquitetura emergente da orla da ilha, entrar no mundo rural do Espírito Santo é um choque radical.

NA ESTRADA

Pegar a BR 262 que liga as capitais do estado e Minas Gerais, ao som do violão do Marques de Salobreña, o espanhol Andrés Segóvia, a caminho de um paraíso é um privilégio.

No rumo traçado em direção a região da Pedra Azul, no alto da serra, o que chama a atenção é a quantidade de plantações de eucalipto, matéria prima para a produção de celulose, indústria de destaque na economia estadual.

As linhas das árvores criam desenhos e recortes nos morros, contrastando com outras culturas e o que está preservado da vegetação original da Mata Atlântica. No decorrer dos 112 km até o destino final, a paisagem agrega também lavouras de café, outro produto tipo exportação da região.

Na parada para abastecimento cachaça, mel e embutidos de fabricação local. No posto, carretas carregadas de madeira preparadas para engrossar o vai-e-vem da BR que liga a costa ao interior em pleno sábado.

Clique AQUI ou na foto para ver o álbum Parada no posto no FLICKR
Parada no posto

TEMPO INSTÁVEL

O tempo nublado, com uma chuvinha peneirada, criava um contraste difícil com o céu chapado para fotografar. A carga pesada dos caminhões se integrava ao quadro, suavizado pela montanha verde adereçada com o efeito cocar das silhuetas dos eucaliptos costurando a junção dos elementos.

Isso foi apenas o começo. No final de semana, o que poderia ser defeito para alguns foi festa! Revelada nos ensaios das imagens. Choveu fino, choveu forte, teve névoa, neblina, nuvens e... sol!


IMIGRANTES DO VELHO MUNDO

A região é colonizada por pequenos agricultores de origens italiana e alemã. É na evolução harmoniosa dessa vocação agrícola que se ancora o charme do destino turístico do PIB capixaba, pioneiro no agroturismo.

Ótimos hotéis, pousadas e restaurantes oferecem um leque de opções para hospedagem e delícias da gastronomia aos visitantes, especialmente no inverno. Tudo cuidadosamente preparado para valorizar o produto (agrícola, comercial ou turístico), embalado por ações modernas de marketing que indicam a profissionalização na gestão dos negócios.

AGROTURISMO

A família Carnielli, oriunda do Treviso, chegou ao Brasil 1888 e se instalou na região cultivando café, milho, criando animais e produzindo seus derivados. Na década de 80, pioneira, investiu no agroturismo.

Hoje, oferece cafés especiais, socol(copa) e embutidos, laticínios, farinha de milho... A linha já está disponível na capital em supermercados, no Café do Horto Mercado, na Delicatessen do Aeroporto de Vitória e numa loja virtual. O próximo passo? A criação de franquias da marca.



Está no setor do comércio a origem da Transverde, a monumental loja de departamento de Pedra Azul, no 90km da BR 262. Inicialmente, o pioneiro levava a produção local para ser vendida na capital. Na volta, trazia encomendas de gêneros de primeira necessidade para os colonos.

Depois, veio a loja de material de construção. Há espaço para todos os tipos de itens dentro do prédio de pedras que abriga o “empório”, com produtos de “A” a Versace. Tudo distribuído pelos dois andares ligados por uma impressionante escada estruturada em madeira maciça, peça que me levou a conhecer o local e “capturar” imagens entre os itens oferecidos no enorme estoque do, também, antiquário.

Irresistível para os visitantes, necessário para os moradores e um pecado para fotógrafos gentilmente autorizados a explorarem os imensos ambientes. Mais um entre os numerosos cases de sucesso do trabalho familiar na serra capixaba.

ORQUÍDEAS, BROMÉLIAS E UM IGUAL

Foi nessa levada que cheguei ao orquidário Caliman. O céu chorava de tempos em tempos e, sentindo os primeiros pingos engrossarem, entrei nas estufas em direção ao prédio principal para pedir para explorar aquele mundaréu exuberante.



O proprietário, ao dar a autorização, alertou: “Pode fotografar tudo, menos eu. Tenho pavor de fotos. Acho, como os índios, que ela rouba a alma dos retratados”. Me senti em casa e entabulei conversa enquanto a chuva despencava do lado de fora. Descobri que era professor de Matemática. Prestou atenção pela primeira vez nas orquídeas numa excursão a Petrópolis/RJ quando perdeu a democrática votação que levou o grupo a uma exposição de espécies no Palácio dos Cristais.

Daí a virar expert e criar o incrível orquidário na região foi um longo caminho que passou por uma formação em filosofia e uma capacidade incrível de se manter imune aos apelos do mundo moderno. Não tem celular, internet nem email. Apenas um telefone fixo. Seu contato foi anotado a lápis nas costas de um panfleto de propaganda de uma exposição de orquídeas num município vizinho. Por respeito a sua privacidade, mantenho seu anonimato. Mesmo, agora, ao agradecer as fotos maravilhosas que fiz no local.

Clique AQUI ou na foto para ver o álbum e se deslumbrar com as imagens do Orquidário Caliman no FLICKR
Orquidário Caliman, Pedra Azul, Espírito Santo

PEDRA AZUL

De lá só saí para trocar a conversa estimulante por uma passagem pela Rota do Lagarto. O tempo mudara e... havia sol!

O caminho circula a Pedra Azul, visível em toda a região, e é passeio obrigatório com diferentes propostas, como o Fjordland, um complexo em que, entre outras atrações, é possível alugar cavalos noruegueses para percorrer a região.

Outro atrativo é Hotel Fazenda Monte Verde, em Vargem Alta. Um dos apelos de seu campo de golfe é justamente o cenário privilegiado do Parque da Pedra Azul, a 650 m de altitude. O tempo instável no final da tarde impediu uma exploração mais demorada do lindo visual das quaresmeiras floridas, agasalhadas pelas franjas da neblina que surgia.

Clique AQUI ou na foto para ver o álbum Pedra Azul no FLICKR

Pedra Azul, Espírito Santo

SINFONIA E SINTONIA

Bom, aqui termina a parte pública do final de semana. A outra, foi a base de bons vinhos. Destaque para a moqueca de camarão e a perdição que é o pé-de-moleque de macadâmia.



A sinfonia da passarinhada para “acordar” o dia não falhou. Mas as maritacas, tucanos e outros frequentadores da ceva da janela da copa só apareceram na manhã de sol. Ruim? Não, perfeito.
Se não fosse o mau tempo não seria recebida por uma orquestra magistral, composta pelo barulho da chuva castigando a floresta preservada e os ventos uivantes assobiado entre as árvores. A natureza conversava com quem conseguia captar sua mensagem. Quem se manifestava era a Mata Atlântica, derramada exuberante aos pés da casa projetada, como outras na região, pelo filho de Zanine Caldas, o mestre das madeiras.



Em termos visuais, só ela mereceria dias de estudos de luz fotográfica. Para uma exploração aprofundada das sutis variações de sua iluminação interna, propiciadas pelos raios do sol, em diferentes posições, que vazavam pelas paredes de vidro emolduradas pela estrutura de madeira da construção... Mas essa é outra viagem!

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “No Rumo”, do SEM   FIM...delcueto.wordpress.com



Edição de Gustavo Oliveira, a quem agradeço a confiança de sempre.
Diagramação Luiz Márcio – O Gênio que, quando chego na marca do gol, dá aquela "colocada" e me dá asas pra voar! Muito obrigado pelo carinho e o cuidado om o material.

Studio na Colab55

quinta-feira, 10 de agosto de 2017

Pampa gaúcho


Pampa gaúcho

A região de Rivera, Uruguai, a BR 293, de Santana do Livramento a Uruguaiana, e a Ponte internacional que liga Uruguaiana a Paso de Los Libres, Argentina.

Uma mistura de olhares amplos e pequenos detalhes.
Pampas gaúchos
Clique AQUI  ou na foto para ver as imagens. Algumas foram selecionadas e estão a venda no GETTY IMAGE

Pampa gaúcho, Uruguai/Argentina/Brasil Rio Grande do Sul, Março e abril de 2017.

Ensaio de Valéria del Cueto
@no_rumo do Sem Fim… delcueto.wordpress.com
@delcueto convida você para explorar o Studio @delcueto
Studio na Colab55

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Canto pros santos do meu canto

Canto pros santos do meu canto

Texto e foto de Valéria del Cueto

Acordar ouvindo a gritaria da passarada na janela enorme a sombra das borboletas de metal que dançam ao vento presas no entorno da não parede transparente. O pulo da cama é para tomar um copo de água fresca e fazer a ginástica diária de subir o toldo e abrir o janelão, deixando o ar da imagem matinal invadir e clarear o espaço do quarto.

Ao descer as escadas não esquecer de apagar a luz. Guia para o caso de precisar ir até a parte de baixo da casa durante a noite. Entre reparar na luz acesa e chegar ao pé da escada de madeira e ferro, a atenção é desviada para luminosidade que vem do lado de fora.

São poucas paredes. Os vãos envidraçados fazem com que tudo se mexa onde normalmente haveria apenas o senso comum de decoração interior. Os raios de sol projetados invadem o ambiente e quanto mais o vento agita as folhagens que cercam a habitação, maior o ritmo do balanço que alegra o chão e as pilastras de sustentação da sala/cozinha vazada. As sombras dos passarinhos que dão rasantes entre as árvores em busca do alimento matinal também fazem da manhã uma festa na Vivenda da Vovó Suely.

O tempo está perfeito. Quase julho e o ar ainda está limpo, como se já não fizesse mais de um mês sem uma gota d´água vinda do céu, apesar de algumas ameaças e a torcida geral por chuvas que adiassem o princípio da secura insuportável do “verão” no cerrado cuiabano.

Deu até uma esfriada. Aquela que o céu fica vermelho e a lua tem um halo em seu redor. Isso, um dia antes da parede de nuvens pesadas se formar para o lado sul no meio da tarde e ir invadindo o horizonte e depois completando o céu inteiro. Chegou o frio! Notado até por aqueles que, mais acostumados que os cuiabanos em geral, só o sentem quando a temperatura baixa dos 14 graus. Pois baixou...

Graças a Deus não durou nem pegou a temporada dos festejos de São Benedito, o santo padroeiro de Cuiabá. Assim, todos os devotos puderam louvá-lo com pompa e circunstância. Especialmente nas atividades da madrugada, como a novíssima lavagem das escadarias da igreja a ele dedicada e o tradicionalíssimo levantamento do mastro, com a imagem do Divino Espirito Santo ornamentando o topo. Diz a lenda que o lado que a bandeira aponta é de onde virá o futuro Imperador, organizador os festejos no próximo ano. Seja cumprindo promessa, fazendo pedidos para o santo, usando sua coroa, entoando os cânticos da missa da madrugada, experimentando o café com bolo depois da função, participando da procissão ou frequentando as barracas de comidas típicas cuiabanas, a fé do povo se manifesta a cada gesto.

Tão significativa e necessária é a devoção aos santos, como o ritual correspondente à natureza local. Ele pede o banho de rio na Chapada dos Guimarães onde, certamente, descem nas águas cristalinas as energias excessivas que se acumulam no corpo e na alma do vivente. Com sorte a água pode não estar muito gelada depois da inevitável descida até a beira do rio Paciência, por exemplo. E não adianta somente colocar os pés na água, molhar as mãos e a nuca.

O ideal é um mergulho físico e espiritual em que apenas o esforço para não rodar riacho abaixo faça o fio terra com o mundo real. Se der, que a conexão seja feita só com a ponta dos dedos dos pés, numa aula prática de física para demostrar como um único ponto fixo pode segurar a força do corpo contra a correnteza das águas.

Como na vida, em que os pequenos gestos e movimentos podem ser definitivos e decisivos diante do turbilhão que nos cerca e tenta nos devorar, serão as delicadezas e sutilezas que nos manterão ligados ao que temos de melhor a preservar.

A essência da simplicidade é a luta pela verdade. A nossa verdade interior. Aquela que insiste em resistir em se manifestar livremente, como um direito que todos deveríamos exercer plenamente em nosso dia a dia.

Lembra da luz ao pé da escada? Voltando para apagar. Ficou acesa...

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Parador Cuyabano”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com
Edição Enock Cavalcanti
Diagramação Luiz Márcio – Gênio
Studio na Colab55

quarta-feira, 3 de maio de 2017

Macela Green no Studio @delcueto


A Coleção Marcela é de beira de estrada. A imagem que gerou a (des)padronagem foi feita entre Santana do Livramento e Uruguaiana, fronteira oeste do Rio grande do Sul, na BR - 293. 

Esta é a época do ano da colheita da marcela, uma tradição que sobrevive em alguns rincões gaúchos e outros campos brasileiros. Mas não dava para fazer uma padronagem de puro e simples capim. 

A imagem foi sendo estilizada, minimalizada e deu no que deu. Uma coleção para ambos os sexos. Da linha clean e funcional do Studio @delcueto parente por afinidade, acredite, das coleções V de Vão V de Vão Azul.

O registro fotográfico de Valéria del Cueto feito na viagem à tríplice fronteira Brasil/ Argentina/ Uruguai, na região oeste do Rio Grande do Sul. O material rendeu fotos e matérias publicadas pelo Diário de Cuiabá/sites parceiros e agrupados na série Fronteira Oeste do Sul aqui No Rumo.

Vem daí também as últimas fotos incluídas na coleção Sem Fim... de Valéria del Cueto no Getty ImagesExclusivas do banco de imagens , elas também estão a venda!

Se você gostou do  Studio @delcuetocompartilhe nosso link com seus amigos e  aproveite as promoções. 

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Aqui, a coleção inicial das artes. Para detalhes dos produtos, passe no Studio @delcueto

Studio na Colab55

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Party in the air

KML 1301006 003 Comissária
Texto e foto de Valéria del Cueto
As portas da aeronave se abriram para acolher os passageiros do enorme avião. Seu semblante sorridente recebia os viajantes desejando a todos uma boa viagem.
Esta situação se repetiu durante milhares de voos pela mesma companhia aérea nos últimos 41 anos.
Uma rotina que a levara a conhecer o mundo inteiro. Ali, passara por situações inusitadas, algumas inclusive perigosas que se misturavam num looongo filme.
Num longo filme, não, numa saga que passava por  rotas diversas, em diferentes países.
Lidara com todos os tipos de pessoas, com costumes variados, línguas distintas, motivações algumas vezes indescritíveis.
Alguns passavam pelas aeronaves da companhia felizes por poderem sair de férias, preocupados com os negócios, alquebrados por alguma ausência...
Perdera a conta de quantas vezes reconhecera, por exemplo, aquele olhar medroso de quem entrava pela primeira vez num avião, sem saber os procedimentos de bordo, a quem ajudou a colocar corretamente o cinto de segurança, a ajustar a poltrona para decolagem ou como escolher o menu das refeições.
Isso falando apenas do que era essencial e necessário para se sentir bem durante, por exemplo, a travessia de um oceano.
Com os anos de trabalho ascendera de comissária da classe econômica para um posto mais nobre. Agora atendia a business class.
Fora uma vida de dedicação que lhe rendera momentos que gostaria de esquecer, como as turbulências da viagem, os que abusavam da bebida, potencializadas pela altitude, e outras situações limites.
Quantas histórias! Agora, apenas para serem contadas, por que a dela terminava ali. Seria seu último voo pela KML, a empresa a qual fora fiel por toda uma vida.
A escala da comissária definira que seu último trecho aéreo seria num voo Rio de Janeiro/ Amsterdam...
O anúncio de sua despedida foi feito pelos alto-falantes do avião, logo no início da jornada.
Tudo correu normalmente, até a hora de ser servido, já no último trecho do trajeto, o café da manhã continental.
Logo depois, a rotina se alterou. Os comissários passaram pelos corredores, explicando mais uma vez, que haveria uma homenagem à antiga funcionária e pedindo aos passageiros que a saudassem a sua passagem pelos corredores de todas as classes do avião. Ao mesmo tempo distribuíam balões e uma espécie de serpentina holandesa para quem quisesse saudá-la. Alguns aceitaram, outros se recusaram a fazer parte da festa.
Vale registrar que a maioria dos passageiros era de estrangeiros e, certamente, nórdicos.
Eis que surge um alegre cortejo de comissários pedindo passagem para a colega. Um trazia um rádio para animar a parada. E lá vinha ela, sentada em cima de um dos carrinhos de serviço, dando adeus a uma vida de dedicação e serviço.
Os aplausos foram muitos durante o percurso, numa cena que as centenas de passageiros dificilmente assistirão novamente. Imagine como seria essa despedida se fosse num avião repleto de brasileiros?   
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Ponta do Leme”,  do SEM FIM... delcueto.wordpress.com

domingo, 12 de maio de 2013

No trecho a pergunta: e o eixo?


Texto e foto de Valéria del Cueto
Sempre fui assim, adepta do “me chama que eu vou”. Para longe ou para perto, ao botar o pé pra fora do  Leme e deixar a minha Ponta, já me considero em trânsito.
Isso, desde os tempos que meiava um barco, lá para as bandas de Angra dos Reis. Na época, meu parceiro (por pouco tempo) vivia reclamando, por que com barco a gente nunca sabe se ele vai andar ou não. Só pra começar (no caso dele) a aventura. Isso o fazia sofrer horrores no meio longo caminho até a marina onde o Corisco ficava ancorado. Ele deixava de aproveitar a maravilhosa paisagem que íamos percorrendo, numa viagem de, pelo menos 3 horas, antes de alcançarmos o ancoradouro onde, como sempre, o motor poderia virar ou não.
De cara saquei a armadilha que fazia com que as belezas da saída do Jardim Botânico, a Lagoa Rodrigo de Freitas, Gávea, São Conrado, Barra, Recreio, a Grota Funda, Sepetiba, Santa Cruz, Itaguaí e toda a espetacular Rio-Santos, até chegarmos a Angra, fossem apenas passando pelas janelas do carro, sem nenhum olhar mais apurado pelas belezas e mazelas que íamos deixando pelo caminho, até alcançarmos  nossa maior incógnita.
No caso, o truque era considerar que a aventura começava quando fechava o portão da garagem da casa. Sei lá se o barco pegaria, o tempo estaria bom, a temperatura da água agradável, o mar virado... Eram tantas as (maravilhosas?) possibilidades!
Foi então que passei a jogar o Jogo do Contente desde o momento em que saía de casa. A brincadeira de Poliana, a menina órfão da história, é muito instigante. Principalmente para quem precisa lidar com um caso de insatisfação quase permanente que acaba podendo contaminar um final de semana inteiro, quiçá o restante da semana e até uma relação.
Para evitar esse “desvio” da imaginação que virou um verdadeiro vício que parei de viajar, pelo menos no sentido físico. Foi em setembro e, de lá para cá, acho que passei um dos meus maiores períodos contínuos que recordo estacionada na Ponta do Leme.
Houve um motivo, reconheço. Verguei para não quebrar. Precisei abstrair do corpo físico para que a alma pudesse se alinhar novamente. O processo não terminou. Mas uma parte, a que me paralisava, parece que começou a passar.
Voltar foi um dos motivos que me impedia de ir. Por que quando vinha, sempre tive com quem dividir o que vi e vivi. Sabia que as viagens não terminavam quando o avião pousava no aeroporto Santos Dumont. Ainda haveria uma oportunidade especial e única para reinterpretar tudo o que eu conseguisse capturar nas estradas e lugares por onda andava.
Agora com o retorno, vi o tamanho vazio que escondi de mim mesma desde a penúltima viagem. E, definitivamente, que não sei lidar com ele.
Nunca fui de contar publicamente o que vi no mundão que já andei, mas acho que, se quiser continuar fazendo o que sempre amei, vou precisar mudar essa maneira de agir.
Se meu mundo não pode mais me escutar, não vou mais do que vergar - novamente. E só até começar a contar para vocês, que faz tanto tempo me acompanham, o que tenho visto por aí, não mais apenas os fragmentos inconsequentes dos meus sonhos...
Começa aqui, a série “No rumo”, do Sem Fim...    
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “No rumo”,  do SEM FIM... delcueto.wordpress.com

domingo, 6 de junho de 2010

A última da Trip





A última da Trip


Texto e foto de Valéria del Cueto




Oce pensa que nois tomemo jeito, nois enganemo oceis. Fingimo que fumo mais vortemo oia a Trip aqui traveis!

Recordista em problemas, defeitos, falhas de comunicação e improbabilidades, este poderia ser o jingle da pior companhia que cruza o espaço aéreo nacional.
Sabe quando um trem começa errado e não tem meio de arrumar? É ela, recorrente e imutável. Sempre com uma desculpa esfarrapada para justificar a incapacidade de atender de forma razoável os incautos que embarcam na sua canoinha furada.

Eis me num novo entrevero. Desta vez no Santos Dumont, na última perna do pior negócio aeronáutico que fiz na vida. Mudou o estado, a cidade, o aeroporto, mas a Trip continua a mesma.

Me apresentei para o embarque marcado para as 18:35. Foi lá que descobri que deste 1 de maio o vôo passara para um novo horário: 19:45. É claro que, apesar de haver apresentado o e-ticket na ida, três dias antes, ninguém teve a gentileza de avisar a humilde passageira da alteração tripiana.

Um diligente funcionário explicou que haviam avisado a maioria dos incautos da mudança, mas alguns – oh, lei de Murphy – não haviam sido localizados. Não teve choro nem vela e a fita da Trip, que já estava pra lá de suja, esgarçou e se desmanchou de vez quando ele  disse que meu celular de contato estava desligado no dia 20, ás 14:20.

A Trip mente, mente, mente. Entre as chamadas não atendidas registradas no  aparelho, lá estava a dita cuja. O celular havia tocado uma única vez e quando tentei retornar a ligação vi que ela havia se originado de um número incompleto. Assim: 0313055... e só. Tentei explicar que um toque só não faz verão e um número incompleto não permite o retorno da chamada. Uma das moças explicou que “é para não saberem de onde ligamos”. Ah, hã... Igualzinho aos seqüestradores e bandidos que chantageiam a gente de números desconhecidos e incompletos, aqueles que as operadoras e a polícia recomendam que não atendamos para não dar chance ao azar!  

Fiquei pasma diante de tamanha eficiência e celeridade. E continuei estática ao saber que o maladeto vôo estava ... atrasado! Pousaria na hora que deveria estar saindo e sairia, soube-o depois, com mais uma hora de lambuja.

Tempo suficiente para tentar localizar a reclamação 58238 feita no SAC da Cia dia 27 de abril e jamais respondida, nem nos 4 dias previstos, nem no mês inteirinho que passou. Claro que, apesar de ajuda de um antigo e experiente funcionário, não obtive nenhum resultado.

Caros leitores, é comovente a solidariedade de alguns bons profissionais dos aeroportos, mas no sentido prático, sabem para que eles servem? Niente. Somos gado e como tal nos tratam.

Mais um exemplo? No painel de partida do aeroporto descobri que não era a única trouxa que desconhecia a alteração do vôo. Lá estava marcado: TRIP: Voo 5500 partida 18:35 portão 7. Isso 24 dias depois da mudança do vôo...

No portão anunciado, a aeronave não estacionou. Na hora prevista para o embarque, fomos direcionados para o portão 12. Do luxo do finger para o lixo do ônibus, apenas uma corrida por meio aeroporto, no más...

Ainda havia outra surpresinha: nem chicken, nem beef. Nem as aeromoças nem os passageiros conseguiram identificar a “carne” servida na refeição a bordo. Segundo a comissária, em alguns aeroportos não há informação sobre o menu servido a bordo. Você, como eu, é alérgico? Fique com fome!

Graças a Deus esse foi meu último bilhete do pacote de ilusões e desencontros desta que não é, definitivamente, uma companhia aérea séria. Como gestora, um conselho que não é de graça por que paguei muito caro para ter moral para dá-lo: parem, reorganizem, ou desistam. Hoje, viajar por essa empresa é uma fria que ninguém merece!


* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte da série Parador Cuyabano, do SEM FIM http://delcueto.multiply.com

domingo, 23 de maio de 2010

Troféu Bad Trip

Troféu Bad Trip

Texto e foto de Valéria del Cueto

Um raio não pode cair duas vezes no mesmo lugar, diz a lenda. Mas como bad trip não  é raio, essa pode sim, acontecer mais de uma vez.

Não me culpem, caros leitores. Juro que tentei me livrar desta possibilidade a um mês atrás, enquanto estava sendo muito mal atendida pela dita cuja companhia e trocar meu bilhete aéreo. Mas qual o que, aumentou meu desespero ao saber que uma nova aventura era inevitável, já que havia comprado duas passagens para o Rio com um intervalo de um mês entre elas.  

A história da bad trip inicial já contei aqui neste espaço e posso resumi-la em poucas palavras: fome, troca de companhia, roteiro, horário e, finalmente, destino. Fui parar, cinco horas depois do previsto, num aeroporto a quarenta quilômetros da minha casa, em plena madrugada carioca.  

Para não perder o bilhete, já que o gerente informou ser impossível a troca, cá estou eu, mais uma vez embarcando em outra aventura. Se depender de minzinha, a última por esta inacreditável companhia. A top zero na soma dos quesitos para uma boa e traquila viagem.

Passei incólume pelo check in, despachei a bagagem e respondi a pergunta da simpática atendente “Corredor ou janela?” optando pela segunda. Ganhei a poltrona 6F para poder apagar entre as escalas Cbá/Goiânia/Confins, encostada na parede, junto a janelinha.

Na hora do embarque recebi uma ligação e, de primeira da fila, acabei sendo uma das últimas a embarcar.  Quando entrei na aeronave, meu lugar estava ocupado.  

Mostrei gentilmente meu bilhete ao ocupante da 6F. Ele me informou que os assentos estavam liberados e que havia sentado ali  por que em seu lugar, na fila 5, havia outra pessoa. Janela, naquela altura, para quem precisava de um apoio lateral para embarcar num sono mais profundo, não havia mais nenhuma...  

Rezando uma Ave Maria, dois Pai Nossos e um Glória ao Pai, me dirigi a chefe das comissárias que se dirigiu ao cavalheiro que pediu que fosse liberado seu lugar original, que lhe era de direito. O rolo estava estabelecido, com a comissária decretando que era cada um por si. Foi aí que ela conseguiu o direito de ser concorrer ao Troféu Bad Trip, ao “finalizar” o entrevero com uma pérola comissarial aérea:  

- Querem saber? Isso não é problema meu! Paralisamos eu e o outro passageiro, enquanto vinha o complemento: Vou chamar o pessoal de terra!

E assim ficamos, a um passo do início do vôo em que os problemas da cabine de passageiros não diziam respeito a chefe das comissárias da... cabine!

Mas a batalha continuava. O gentil senhor me cedeu seu lugar depois de ouvir os meus motivos e aguardava que lhe cedessem o seu respectivo assento. Eis que surge o representante de terra, informando que o problema “se devia ao fato de Vilhena, em Rondônia, estar sem internet”. Ia esbravejar, juro.Afinal, e nós com Rondônia???? Goiânia, Belo Horizonte, Vitória(!) e Rio de Janeiro, tudo bem, mas a bad trip ser iniciada em Rondônia?

Não tive tempo de reagir quando vi que o portador de tão relevante e preciosa informação, digna de incluí-lo na disputa do Troféu Bad Trip, nada mais era do que meu velho conhecido Jean, gerente local da companhia aérea.  

A primeira coisa que reparei foi no embranquecimento dos seus cabelos, muito mais grisalhos que a um mês atrás. Fácil de explicar este fenômeno, pensei com meus botões. Minha atenção se desviou para a súbita perda de cor da sua face, quando ele reconheceu em mim, mais uma vez, a razão dos seus problemas..

Cheguei a pensar, por um momento, que o troféu seria todinho dele. Somando a atuação do último mês com a informação incrível da internet de Vilhena ele era, pensava eu, imbatível. Mas qual o que, ledo engano... A mesma comissária, a quem os problemas da cabine não diziam respeito, olha nos olhos do passageiro deslocado e ainda não acomodado e informa cheia de moral e sabedoria ancestral:

- Meu senhor, o senhor pode escolher seu assento. O que posso lhe garantir é que o senhor vai chegar a seu destino!

Diante de tanta certeza e decisão, após pedir licença, o passageiro despencou na poltrona ao lado enquanto a aeromoça, numa meia volta quase militar, se dirigia à frente da aeronave pelo corredor totalmente vazio. O gerente de terra após se recobrar do susto do reconhecimento da humilde escriba que vos narra tão saborosa situação, havia vazado rapidinho, feliz por fugir de mais um embate que se armava. Tadim, perdeu a chance de levar para casa o almejado troféu Bad Trip.  

A comissária de bordo Juliana que não usava identificação, por que, conforme me explicou no final da viagem, havia se esquecido de botar o broche com seu nomezinho na lapela, sem dúvida nenhuma, desta vez, levou a melhor e o prêmio de atendimento aéreo inesquecível.

Alguém se habilita a uma nova bad Trip? Eu, enquanto puder escolher meus caminhos pelos céus do Brasil, garanto que dispenso a possibilidade...  

* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte da série Parador Cuyabano, do SEM FIM http://delcueto.multiply.com  
 

domingo, 25 de abril de 2010

Bad Trip



Bad Trip



Texto de Valéria del Cueto


Juro que daria tudo para não estar escrevendo este relato. São 18 horas em Cuiabá, 19 no Rio de Janeiro. Se o céu da minha trip fosse de brigadeiro estaria a 3 horas da Casa da Gávea, onde o curta metragem História Sem Fim do Rio Paraguai será exibido e comemorado o aniversário da Denise del Cueto, mulher do del pai.

Qual o que, meu sofrer  começou no balcão da cia. aérea, onde fui informada que o vôo que embarcaria havia sido cancelado. Isso mesmo.
 
Oh, meu santo protetor dos passageiros enganados, vilipendiados e traídos, onde estavas quando o senhor Jean gerente da enrolação e da quebra de contrato me dava a opção de embarcar num vôo de outra companhia , uma hora e meia depois, com destino a Guarulhos e, depois de um pit stop de mais de 2 horas, seguir num vôo para Teresina, com uma escala redentora no Galeão? Talvez muito ocupado, com justíssima razão, com as cinzas do vulcão europeu que ora provoca um efeito dominó na malha viária do velho continente e adjacências.

Enfim, estávamos, eu e mais outros tantos otários, com um bilhete que nos prometia desembarcar às 22 horas e 27 minutos no aeroporto Santos Dumont, na entrada da baía de Guanabara, sendo remanejados  para um vôo de uma companhia amiga, com destino a Ilha do Governador. A chegada esta(va) prevista para a  00 horas e 40 minutos. Começava a bad trip me impede de chegar ao Santos Dumont e  ainda por cima desembarca o pacote há dezenas de quilômetros do destino desejado.

Havia outra opção? Sim,  perder o filme e o feriado aguardando a voada do dia seguinte.
 
Avisar os otários do desastre, anunciado pelo menos uma hora antes, de acordo com a atendente, e o dobro do tempo, segundo o gerente Jean, não pareceu uma ideia plausível para o último, que arregalou os olhinhos e tascou a pérola:
- Não temos tempo para isso. Disse-o,  como quem declara que o problema não é dele mas, sim, dos trouxas que com um simples aviso poderiam reorganizar suas vidas, procurar outras opções ou, simplesmente, mandar-los catar coquinhos.

Fiquei pasma quando descobri que éramos apenas 15 vítimas, destinadas a trocar, entre outras coisas, o conforto alimentar da companhia que escolhemos pelas 8 minguadas bolachinhas que nos couberam no ágape da substituta. Isso sem falar na diferença básica da dimensão das poltronas.

A novela estava apenas começando. O capítulo seguinte  reservava outra surpresa. Não é que o vôo até Belo Horizonte, com escala em Goiânia existia? Atrasado, mas aguardado pelo restante dos passageiros.

Bom, fúria é pouco. Ampliada pelo fato de que cada “mala viajen” com sua solução capenga serve para considerar cumprido o contrato firmado no bilhete. Que serviço porco, quanto descaso com os bobalhões que escolheram voar pela dita companhia...

Tempo, tempo, tenho tempo. Horas no confortabilíssimo aeroporto internacional Marechal Rondon. O suficiente para procurar os meus direitos. Não, não é piada!

Piada foi chegar no balcão da empresa e pedir para usar o telefone para fazer a reclamação via 0800.
- A senhora quer o que? Pergunta a gentil, porém intrigada atendente.
- Usar o telefone, expliquei, para fazer uma reclamação.
- Pelo nosso telefone? Não entendi...
Relatei a situação e pulei para a próxima mocinha, esta, do lado de lá da linha.
- Trip reservas, boa tarde.
- Boa tarde para você também, quero registrar uma reclamação.

E começou a lenha. Pois, na concepção da moça Renata, eu não tinha motivos para isso. Arranquei a ferro e fórceps o número do protocolo e resolvi ampliar a área de protesto, procurando a ANAC. Ela sim, a que fica no desembarque, no barraco decadente ao lado.

Chegando lá, outra surpresa. Foram-se os tempos em que um gentil funcionário descia com a gente e ia na companhia averiguar o problema e tomar uma providência imediata. O funcionário em questão, muito gentil, por sinal, ainda está lá, há 26 anos, diga-se de passagem. Mas reclamações, só pelo site.

Quanto a soluções para os problemas dos passageiros, bem, é mais ou menos como reclamar com o bispo. Por essas e outras é que as bad trips pululam impunemente por mais de 70 destinos, anuncia o banner, diante do balcão às moscas, para onde retornei desolada.

Bom, conseguimos, finalmente, decolar com mais outros 20 minutos de atraso. E daí? A espera em Guarulhos se arrastou por mais de duas horas. Falo só para constar, por que isso não faz diferença mesmo, né? Estamos no trecho.
Só espero que o tal santo protetor dos passageiros enganados, vilipendiados e traídos esteja mais liberado (o que é claro, não aconteceu). Achava, e com razão, que precisaria - e muito - da ajuda dele quando, depois da meia noite, virasse abóbora e tivesse que ser repatriada para o Leme, da Ilha do Governador, via Linha Vermelha.

Quanto a meu compromisso, sorry espectadores, perdoe-me aniversariante, mas, além de bad, o trem da trip não conseguiu sair da estação da incompetência e, graças ao desempenho exemplar da parceira aérea, acabei desembarcando em solo carioca mais ou menos a 1 e 40 da madruga. Falhei, sim, mas com um serviço desses, quem pode me culpar?

* Valéria del Cueto é jornalista, cineasta e gestora de carnaval. Este artigo faz parte da série Parador Cuyabano, do SEM FIM http://delcueto.multiply.com
 

quinta-feira, 6 de outubro de 2005

SABIÁ VERMELHA, PLENA DE GRAÇA... E DE LUZ!



Arvoredo da esquina
07/10/2005

Agora quem vai é Tereza. Albues. Eisenstat. Ela é Pedra Canga, da Chapada da Palma Roxa. Sua Travessia dos Sempre Vivos é o Berro do Cordeiro em Nova York. Foi lá que a conheci. Tereza me apresentou ao Brooklin, me enfurnou em Manhattan, me abrigou na casa de Marcelo Fiorini, antropólogo brasileiro que, hoje, creio mora em Paris.
Mas de tudo que Teresa me mostrou nesta viagem em que fui bater com os costados em sua casa indicada por Glorinha Albues, sua irmã, o mais surpreendente foi sua obra. Gastei em dólares para, nos EUA, ter o prazer de retornar a Mato Grosso através da literatura de Tereza. Uma tarde, no jardim de sua casa, depois de uma garrafa de vinho, acompanhada de queijos e salmão, deitada num banco, lagarteando no sol pálido que tentávamos capturar, ameacei o que ela pensou ser um protesto sobre esta situação. Tereza me olhou e perguntou por que não deixava para ler os livros quando retornasse ao Brasil. Tive que rir…
O primeiro livro que abri, pensando em ler apenas a dedicatória, era “Pedra Canga”. Comecei e não parei… Li em viagens de metrô, em lanchonetes de museus como o Metropolitan, li na fila para comprar ingressos para o Stoomp. Só não li na Exposição que fui com Robert, seu marido, ao Guggenhein.
Esta exposição comemorava os 100 anos de uma das minhas maiores paixões: motocicletas. Fomos no último dia. Ali, a força das histórias de Teresa foi substituída pelos cavalos dos motores da coleção de todos os tipos de máquinas expostas dentro e fora do museu. Ali havia centenas de motocicletas de aficionados que visitavam a exposição e roncavam seus motores desfilando pela beira do Central Park. Quando fecho os olhos, consigo ouvir o ruído dos motores, como uma sinfonia. Assim é a obra de Teresa. Uma parte, lemos. Outra, apenas sentimos e guardamos… E esta sensação, este sentimento profundo, perdura na nossa imaginação.
Quem me deu a notícia que Tereza tinha partido, foi André Mux. Tanto carinho teve nosso amigo ao fazê-lo, que também me indicou o lenitivo, o remédio para aplacar a dor e consolar a alma de todos aqueles que estão, como eu, com um grande vazio pela partida de Tereza. André me mandou ler a última página do “Berro do Cordeiro em Nova York”, publicado em 1995. E é a própria Tereza quem nos dá a dimensão de quem é, e para onde vai.
“A vibração da última corda da harpa, até agora emudecida, sobrepõe-se aos ruídos da manhã novaiorquina, enchendo o ar de melodias antanhas, algumas já esquecidas, nos subterrâneos de mim, quase não as reconheço. A corda é tensa, dolorida, fere o dedo que a dedilha, fere a si mesma na aspereza de sua textura. Ainda assim o som irrompe, pujante, profundo, suavizando o agreste da alma que o compõe. Meu cântico de liberdade ainda não está completo, mas a cerimônia da visitação do sol me confirma que neste instante meu destino entrou em comunhão com as energias da terra onde nasci. Ao solo norte se junta o solo sul em louvores à mãe Terra, uníssonos. A nova música me cobre de glória íntima solto-a no espaço, espalha-se ruidosa no céu como bandos de aves do cerrado em migração. Que de repente, surgem no horizonte, alvissareiras. Bato asas velozes, gorjeio, vôo ao encontro das antigas companheiras, palpitante. Nas águas espelhadas do rio Hudson, a imagem arisca. Da sabiá vermelha cruzando os céus de Manhattan, plena de graça e luz.”
Assim é Tereza Albues Eisenstat, uma mato-grossense iluminada, em qualquer lugar em que se encontre…
*Valéria del Cueto é jornalista e cineasta.