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segunda-feira, 30 de dezembro de 2024

No princípio (também) era a roda

No princípio (também) era a roda

Texto e fotos de Valéria del Cueto

Um réveillon sem o espocar das rolhas de champagne e espumantes na virada do ano em Copacabana. O som só será ouvido se levarem gravações do pipocar característico das comemorações da entrada do ano junto a Rainha do Mar, Iemanjá. Vidros estão proibidos e confiscados nas barreiras de acesso a praia.

Comecei pelo final e volto ao início.

Nele, as famílias e amigos dos moradores de Copacabana iam até a orla observar a celebração dos terreiros que, em rodas espalhadas pela areia, faziam seus rituais para homenagear Iemanjá e outros orixás na virada do ano.

De branco, com suas vestes características, dançavam ao som de atabaques e berimbaus iluminados pelas velas cercadas de oferendas depois lançadas ao mar junto com muitas flores. A energia do axé podia ser sentida e partilhada por iniciados e curiosos que passeavam entre as rodas recebendo bençãos generosas.



Aí, surgiu a cascata de fogos do Hotel Méridien que escorria pelo prédio. Depois os fogos na areia. (Terá sido em ordem inversa?). A passagem de ano em Copacabana virou atração turística...

Os primeiros expulsos foram os que criaram a fresta com seus deuses. A multidão crescia ano a ano e passou a ter donos. Áreas começaram a serem delimitadas. Dos shows, seus palcos, backstages, áreas vips; dos quiosques, cercadinhos...

Um acidente com os fogos na areia provocou o deslocamento dos efeitos especiais para o mar com o uso de balsas para seu lançamento no cenário cinematográfico da Princesinha do Mar. A competição com outros pontos turísticos do globo se acirrou: maior público, poder pirotécnico...

E, claro, o espírito inicial da festa religiosa a beira mar se perdeu, engolido pela multidão e pela fome de lucro. Com o tempo os moradores do bairro ficaram reféns da organização do maior réveillon carioca. Trânsito interrompido, metro superlotado, insegurança e sujeira, apesar dos esforços sobre-humanos dos garis, heróis urbanos invisíveis.

Durante anos deu para driblar esse “avanço civilizatório”. O Leme sempre foi o paraíso que incluía uma imagem única do Caminho dos Pescadores onde eles, os próprios, se reuniam no final e faziam uma comemoração especial para saudar o novo ano. De lá o registro de Copacabana a meia noite é especial. Não vou contar o porquê. Se quiser conferir procure nos àlbuns dos réveillons que passei por lá.

Foi nesse período que dividi a meia noite em duas etapas, nos tempos do horário de verão. Nos fogos fotografava e gravava, no horário do fuso de Cuiabá brindava, fazia meus pedidos e comia as uvas verdes, uma para cada mês do ano vindouro.

Um dia, quando fui em direção ao Caminho do Pescadores um tempinho antes da meia noite para pegar um bom lugar na mureta, uma multidão atrapalhou os planos. O quiosque no canto da Pedra havia sido turbinado. O resto não preciso explicar. Nem só o mar dos surfistas fica crowded.

Saí do Leme que não saiu de mim, mas ficou muito longe para ser alcançado na movimentada noite da virada. Cruzar a praia da ponta do Forte Copacabana até o Leme ficou impossível. Ainda mais na volta, sem transporte. Todos os anos quando vejo as luzes da minha ponta, de onde estiver em Copacabana ou fora dela, fecho os olhos e me transporto para as areias de onde sou cria comemorando o privilégio dos maravilhosos réveillons que lá passei.

Esse ano vai ser diferente. Não sentirei a distância. Nada, eu disse, nada me faria almejar a programação gospel do palco do Leme, que, em anos anteriores, foi o palco do samba! O prefeito Eduardo Paes fica devendo essa escolha equivocada aos moradores do Leme. É só mais uma de muitas. Só não vê quem não tem memória.

Vamos ver como reage Iemanjá a ausência do axé do espocar das champagnes em sua homenagem na hora da virada. Pode ser que nem note no alarido da multidão de milhões de pessoas. Pode ser...

PS: “No princípio era a roda – um estudo sobre o samba, partido alto e outros pagodes” é o título do livro essencial sobre o assunto de Roberto Moura.

*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Da série “Ponta do Leme” do SEM FIM ... delcueto.wordpress.com

Studio na Colab55

segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Cego dos óio

Cego dos “óio”

Texto, foto e vídeo de Valéria del Cueto

Com secura de mar. Foi assim que chegou na praia. Saboreou cada detalhe do caminho antecipando alcançar a sensação irreal de normalidade de buscava.

Deu bom dia ao porteiro elogiando as orquídeas que floresciam abraçadas na árvore da rua em frente ao prédio.

Trocou uma ideia na portaria vizinha sobre as birutas sonoras amarelas instaladas depois de anos sem serem necessárias e colocadas, aliás, no momento em que a energia elétrica que aciona as geringonças está pela hora da morte.

Subiu a rua quase ladeira rumo ao Arpoador, Ipanema, cartão postal do Rio de Janeiro. O sol, que andara escasso em outubro, estalava no céu surgindo no rendado das folhas de amendoeiras frondosas que sombreiam a rua.

Quando cruzou a última pista e precisou prestar atenção ao espaço dos ciclistas, já ouvia o som do trompete do músico que bate ponto no primeiro banco na entrada do Garota de Ipanema. Enquanto contornava o parque ouvia os tristes acordes de Assum Preto, de Humberto Teixeira e Luiz Gonzaga, o cego dos “óio” que canta de dor.

Na passagem lateral que leva à praia as pitangueiras coladas ao muro grafitado estão carregadas de frutos amarelos. Os vermelhos, perpitolas, como dizem os cuiabanos, são colhidos por quem reconhece as árvores frutíferas, ainda mais nessa época de escassez.

A praia se descortina à frente. O sol, sem uma nuvem no céu, reina soberano e absoluto.

A blusa de manga comprida parece quente demais. Só parece. Quem “é da praia” sabe que ela é essencial na hora de voltar pra casa quando, com o corpo quente, tiver que percorrer o caminho sombreado e, talvez, enfrentar os corredores de vento nas ruas do bairro.

A areia da praia não está cheia (ainda) e o mar bate num som que, não pergunte como, indica a subida da maré. O truque é não ficar na beirada para poder escrever tranquilamente. Esquecer a linha de frente. Isso é o que garante não haver surpresas quando a maré subindo der o bote para recuperar seu espaço.

Antes da água surpreender a distraída com o caderninho, os banhistas instalados próximos à água darão o alerta. Para facilitar, usa como marcação o homem-camarão. Aquele que dorme distraído ao bronzeamento se preparando, inadvertidamente, para uma noite de sofrimento inesquecível.  

O mar baixou e tem uma linha animada de surfistas. Pelo horário e o estilo dominante não está nela a rapaziada local que prefere as ondas que fazem a fama do point em dias de ressaca.  

O Rio está cheio e o sotaque do grupo ao lado é de sulistas. Comentam sobre o visual das acomodações que ocupam na cidade.

Definida a ocupação é estender a canga na direção sul, tirar a máscara (sim, ainda necessária para quem não está afim de bater palmas pra maluco Bolsonaro ou Eduardo Paes dançar) e, finalmente, ser invadida pelo tão almejado cheiro da maresia.

Ao sacar o caderninho está decretado o fim de todos os incômodos. Até o do som da música porcaria do grupo que se confraterniza a alguns metros adiante. É hora de mergulhar nas sensações de um dia normal.

Tudo cronometrado. Quando as linhas definidas pelo editor do jornal para o espaço ideal da crônica estão se esgotando o homem-camarão pula, levantando seus pertences. Sua toalha é alcançada por uma onda atrevida!

Hora de levantar a cabeça, focar a vista em direção ao sol que desce cinematográfico em direção a ponta do Vidigal e fazer aquela foto cartão postal “cego dos óio” pela beleza para ilustrar a crônica.

*Valéria del Cueto é jornalista e fotógrafa. Da série “Arpoador do SEM FIM... delcueto.wordpress.com

 




@delcueto.studio na Colab55

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Piacatuba, distrito de Leopoldina, Minas Gerais

Piacatuba, distrito de Leopoldina, Minas Gerais

Estive em Piacatuba no 16. Festival de Viola e Gastronomia, no último final de semana de julho de 2019. As informações sobre o Festival renderam a matéria de Capa do Diário de Cuiabá, reproduzida em vários sites e blogs "Se é pra chorar que seja ela, a viola"

Nos dois dias trabalhei com vários temas. O Festival em si, a conversa na janela, o mato-grossense João Ormond, as flores e, pra fechar, os objetos da percussão de Gabriel, do Rodrigo d' Sá e os Serafins, grupo de Leopoldina, sede onde está localizado o distrito de Piacatuba, na Zona da Mata mineira.

Clique AQUI ou na foto para acessar o álbum "Festival de Viola de Piacatu", no Flickr


#valerio2019
#Piacatuba

Algumas dessas fotos estão na coleção Getty Images de Valéria del Cueto, as demais fazem parte do acervo da fotógrafa em @no_rumo do Sem Fim

Ensaio fotográfico e registros no canal del Cueto, no youtube de (C)2019 Valéria del Cueto, all rights reserved

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sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Que seja breve e nos leve...


Que seja breve e nos leve...

Texto e foto de Valéria del Cueto

Existem lugares por onde passo que preciso (d)escrever logo para não deixar escapar as sensações que provocam. Outros que sei, mesmo que demore a trazê-los para o papel, o farei de forma absolutamente fiel, já que a passagem por eles é inesquecível. O interessante é que esses últimos, costumam surgir quando a gente menos espera. A região da Colonia Nueva Independencia, no município de Zanja-Pyta, departamento de Amambay, fronteira do Paraguay com o Brasil, é um deles.

O ponto de partida dessa aventura de descobrimento de novas paragens foi Ponta Porã, em Mato Grosso do Sul. Os companheiros de estrada a Kiki, amiga de infância que reencontrei nessa viagem, e Gilson, nosso guia e personagem de destaque dessa crônica. “Partimos pela MS 165, a estrada margeia a fronteira”, explicou Gilson. Criado palmilhando aquelas bandas nas antigas comitivas de gado, ele apontava os postes de energia  que seguiam paralelos, indicado a ruta sem asfalto do país vizinho. A paisagem, um tédio só, na região de Aral Moreira, é soja e só soja. Estávamos no alto de um planalto e a cultura sustenta o município, distrito de Ponta Porã até 1976.

Por mais que olhasse o entorno, confesso, não via grandes expectativas em relação as possibilidades de alcançarmos em pouco tempo as paisagens que ele mencionou quando lhe disse que procurava lugares especiais e desconhecidos da fronteira, na conversa numa tarde gelada na Jacarecanga, o lugar mágico em que Kiki mora, uma chácara próxima a Ponta Porã.

Em um pouco mais de uma hora chegamos a Aral Moreira e, dobrando numa rótula, mudamos de rumo em direção ao país vizinho. O posto aduaneiro paraguaio parecia cenário de um filme de Roberto Rodriguez, tipo “Desperado”, com Antonio Banderas. A construção era ladeada por uma cancela de madeira. Sentado na frente da guarita um policial acenou respondendo ao nosso cumprimento liberando a passagem sob o olhar sonolento do vira-latas deitado a seus pés. Certamente, por ali, todo mundo se conhecia.

Uma centena de metros percorridos serviu para comprovar que a promessa de Gilson de nos apresentar a um paraíso seria paga e com sobras. A estrada de terra seguia pelo topo de uma cordilheira de onde se descortinavam paisagens belíssimas. Quando pedi uma parada para fotografar ele avisou que era apenas o começo da festa e ficaria ainda mais sensacional quando avistássemos o Cerro 21. Sábias palavras! Insuficientes para descrever o que nos esperava na descida em direção as terras de Seo Orlando, seu pai.

No caminho que serpenteava a cordilheira mais fotos, inclusive da capelinha que sua avó, uma das primeiras moradoras das antigas terras devolutas paraguaias, mandou construir em pagamento a uma promessa feita para São Silvestre. Já no pé da capelinha, projetada no meio do contraforte, o próximo desafio foi mais complicado, porém altamente compensador. Gilson perguntou como andava nossa “forma física” e, dando um “changüí”, carregou a mochila do equipamento fotográfico na subida por uma suposta trilha na encosta em direção a pequena construção de pedras.

Valeu a pena, apesar de algumas paradas para recuperar o fôlego abraçando as árvores centenárias para disfarçar o cansaço em meio ao “não” caminho. Que vista, que paz! Do platô onde a capela foi construída se descortinam 300 graus de grandiosa beleza natural comparável, talvez, ao visual do Morro do Paxixi, na Serra de Maracaju, em Mato Grosso do Sul.

De lá descemos para a fazenda onde Seo Orlando e Bernadete, sua mulher, nos esperavam com um tereré e um chimarrão caprichados. Cada um preferia um tipo de preparo para a mesma erva-mate, típica da região.

E, se o visual do fim de tarde entre os potreiros e os recortes dos desenhos que se formavam nos paredões não fossem suficientes, a prosa de Seo Orlando fechou com chave de ouro esse dia inesquecível. Ele havia sido garimpeiro e, em busca de riqueza, palmilhado o Centro Oeste esquadrinhando Mato Grosso com as levas de garimpeiros nas corridas do ouro entre as décadas de 1970 e 1990. Entramos proseando noite adentro enquanto Gilson preparava um carreteiro daqueles que a gente come de joelhos.

A conversa ia longe! Nossa “viagem” nas lembranças nos fez recordar os caminhos do ouro, tanto pela região oeste de Mato Grosso, quanto subindo a BR 163 em direção ao garimpo Castelo dos Sonhos, no Pará. Suas aventuras aconteceram no período em que vagueei pelo  estado como repórter acompanhando algumas histórias da formação e desenvolvimento estadual. Uma daquelas coincidências que atiçam a prosa e fazem brotar recordações de muitas vidas e caminhos.

Nos despedimos com a certeza de um reencontro na próxima vez que voltar à fronteira onde passei minha infância. Ainda há muitos capítulos dessas verdadeiras sagas e experiências a serem lembradas e registradas! Que seja em breve...

* Changüí – Vantagem que se concede a uma pessoa ou a um grupo, especialmente no jogo ou no esporte.

** Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Crônica da série “Fronteira Oeste do Sul” do SEM FIM... delcueto.wordpress.com
 
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quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Lá e cá


Lá e cá

Texto e foto de Valéria del Cueto
Depois de um texto burilado e trabalhado em referências, como o da última crônica “Na luta é que a gente se encontra”, a vontade é de só falar de banalidades para quebrar a linha de raciocínio. E, claro, por saber que é muito difícil ir mais longe na excelência do produto.

Só que ainda me lembro do compromisso que talvez você, leitor, não se recorde: continuar viajando pela fronteira de Mato Grosso do Sul e, quando dá, cruzar para o lado de lá, o Paraguay... Então convido você a seguir pela Ruta 5, em direção a Bella Vista, na província de Amambay, ao norte do país vizinho.

Saindo de Cerro Cora seguimos para a Hacienda Ñe´a. Uma pena que com a pressa (queríamos chegar com a luz da tarde), não deu para ir fazendo paradas para fotografar o relevo que desenha o perfil das paisagens que passaram voando pelas janelas. Um tereré circulava entre as passageiras da aventura: Adriana, Rosanie, Dora e Natália, todas da família Nuñez.

A sede da hacienda é protegida por uma cadeia de montes. Adriana até sugeriu um passeio a cavalo para explorarmos a região, mas declinei. Estava satisfeita com as construções que avistei em volta da linda casa principal. Fora isso, é claro, tive o bom senso de evitar as dores que, certamente, sentiria nos dias seguintes. Não monto há anos!

Quer saber? Para esgotar as possibilidades fotográficas da Ñe´a preciso de muito mais tempo do que a tarde que por lá passamos. Pelo que vi imagino as nuances da luz em diferentes períodos do dia, como o amanhecer e o anoitecer, e as variadas cores da vegetação do entorno conforme mudam as estações do ano. É material para muitas idas e passeios. O visual ainda estava marcado pela estiagem comum nesse período. Isso dava à morraria, especialmente no cair da tarde, tons dourados que contrastavam com a vegetação que renascia.

Ao lado da casa principal uma pequena represa compõe a visão bucólica e serve para banhos refrescantes nas épocas mais quentes do ano. O que chamou a atenção foi a “passarela” de tábuas de madeira usada para as lavadeiras baterem as roupas no curso d´água. Cena típica de tempos e práticas de antigamente.

Depois de mais uma rodada de tereré na varanda da casa principal era hora de um giro pelos galpões, oficinas e a área das moradias dos peões. Trabalhando com o contraste das sombras que se alongavam com o cair da luz fui fotografando a vizinhança.

A câmera atraiu a atenção das crianças que brincavam entre os varais de roupas que secavam ao vento. Uma se aproximou cheia de curiosidade perguntando o que eu fazia. Expliquei que fotografava a hacienda. Outras  foram chegando e pediram para que as fotografasse, o que, é claro, aceitei prontamente. Agora, era um grupinho que fazia pose e me intimava para ver no visor o resultado. Um dos meninos foi buscar uma bola. E dá-lhe clique! Outro, dava ideia de subirem na cerca da mangueira. Aí, a “direção” da brincadeira já não era da fotógrafa...

Nem prestei atenção ao sol que caía rapidamente e produzia uma luz quase frontal perfeita para os registros. Fui andando a procura do ponto ideal para pegar o pôr-do-sol, mas não resisti ao chamando da criançada que dava a dica de outro cenário. Dessa vez na varanda do galpão do estábulo, com arreios e tralhas ao fundo. Arrumei os assistentes perfeitos. Melhor “frente de locação” impossível... Foram eles que me contaram onde as imagens ficariam melhores.  Me despedi dos “eres” explicando que achava que voltaria logo trazendo as fotos impressas.

É o que, creio, acontecerá em breve. É nessa região que pedirei asilo depois dos resultados do segundo turno das eleições. Será a rota de fuga mais adequada para me dirigir nos próximos meses. Vai ser difícil aturar o juiz que, provavelmente, fará dobradinha com o bispo no Rio de Janeiro e a dupla de milicos em posições invertidas que avança sobre a democracia brasileira.

Mas espere, caro leitor, não é agora! Antes cairei no samba num verão carioca inesquecível que terá seu ponto alto no desfile da Sapucaí. Será um carnaval temperado por enredos como “Xangô”, do Salgueiro, e “História pra ninar gente grande”, da verde e rosa. Esse contará ao Brasil e ao mundo quem são os verdadeiros heróis populares do país que não está no retrato ritmado pelo surdo de primeira que marcará os 60 anos da Bateria da Mangueira! E eu? Estarei lá...

* Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Das séries “Fronteira Oeste do Sul” e “É Carnaval”, do SEM FIM... delcueto.wordpress.com
 

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quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Logo ali

Logo ali

Texto e foto de Valéria del Cueto

Fiz que fui, quase fiquei mas, para felicidade geral, acabei indo. A vida é uma partida de futebol interminável incluindo os deslocamentos pelo campo que é esse mundão de Deus. Como todo bom jogador completo vou para onde o técnico manda. Porém, confesso, tenho minhas preferências e, quando posso, faço escolhas próprias baseadas em algumas variáveis.

Adoro ir onde o vento leva. Mas hoje, além do bom tempo, sigo as correntes dos preços das passagens aéreas, as cotações das moedas de países da lista de desejos e outros critérios mais objetivos do que gostaria esse ser viajandão.

Reconheço que em alguns momentos apago as prioridades e tomo um rumo certeiro por exigência de sobrevivência do equilíbrio básico necessário para fortalecer meu eu interno. Aí, troco o oceano de água salgada por um imenso mar de água doce no centro do continente sul americano. Nele, me dispo das camadas do convívio ligeiro e superficial para encarar o mais difícil e complexo personagem do repertório da vida: ser eu, apenas eu.

Tá, já sei sua pergunta: “o que a água doce te dá que a salgada não te traz?” A resposta é dolorosa, mas real. Entre outros benefícios, a segurança.

Na minha praia carioca todos os sentidos têm que estar alertas. Mesmo em momentos como esse de concentração literária. Tudo pode acontecer e, das duas uma, ou vira crônica ou motivo de, com toda a agilidade disponível, levantar acampamento e seguir outro destino.

Foi assim, quase traumática, a última experiência no Arpoador. Do luxo ao lixo em poucos e preciosos minutos. De uma crônica inspirada sobre o paraíso  “Quase perdido”, a ser testemunha involuntária de uma barbárie oficial no horário nobre do por do sol mais famoso do Rio de Janeiro, talvez do Brasil, quiçá da América do Sul. Tirei de letra a crônica da felicidade e registrei em vídeo a violência oficial da guarda municipal, cotidiana e banal na cidade partida.

No impacto dos acontecimentos concluí que era hora de trocar o tempero das águas cariocas por correntes menos imprevisíveis. No “unidunitê” dispensei os “salameminguês” e usei um critério climático para cravar o novo destino.

Na dúvida, entre o Pantanal de Mato Grosso e o irmão do sul o segundo levou a melhor. Nele, como em todo nosso Centro Oeste agro pop, a umidade do ar está um pouco mais relativa e amigável. Volto às origens, agora partidas, de uma terra especial que (re)conheço desde criança. Fugindo da secura caí para o oeste e para o sul.

Do alto da serra de Maracaju vislumbro o doce mar que tanto anseio. Quero o silêncio barulhento das águas, da terra e dos animais para substituir as batidas das paredes sendo derrubadas nas múltiplas reformas do meu quadrado copacabanense. O sussurrar das folhas ao vento ao invés do som do corte do esmeril que entra pela janela transformando meu pequeno mundo numa cadeira de dentista com a broca indo e vindo 8 horas por dia.

Não, não é aqui no avião que atingirei o nirvana. Pelo menos no trecho Rio-São Paulo. No agradável trajeto uma menininha de uns três anos resolveu decretar o apocalipse e, da decolagem ao pouso, berrou delícias a todo pulmão do tipo: “Estou com meeedo”, “Balançoou...”, “O avião vai cair...”.

Tirando a gritaria em si, nada disso me abala, mas pegou na veia de outros passageiros que, de tanto aguentarem a ladainha desesperada da pequena, foram emprenhados pelo ouvido e, apesar da tranquilidade do voo, resolveram distraí-la. Adiantou? Não.

Os excelentes pais sem domínio sobre a cria deixaram o tumulto correr frouxo. Nada que meio Dramin, para fazer a malinha sem alça e sem rodinhas descansar, não resolvesse. Ou um pouco de autoridade familiar. Mas aí também era querer demais... Melhor abstrair e ignorar as expressões da metade dos passageiros enfurecidos e incomodados. Eles que se mudem! Mas para onde?

Foi a última prova antes de alcançar o nirvana que buscava. Duríssima! Não sucumbi e resisti. Agora, estou no trecho como gosto. O paraíso é logo ali...

*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Da série “Fronteira oeste do Sul”, do SEM FIM...delcueto.wordpress.com


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segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Pipa, Tibaú do Sul, paraíso do RN

Pipa, Tibaú do Sul, Rio Grande do NortePipa, Tibaú do Sul, RN

Pipa, em Tibaú do Sul, município no litoral ao sul de Natal, capital do Rio Grande do Norte é um paraíso descoberto por surfistas. A região,  com suas belas praias, como Madeiro e do Amor, virou point re-conhecido internacionalmente.

Ensaio para "Quem procura, acha, da série Nordeste, em julho de 2016, por Valéria del Cueto  na viagem realizada a convite do Governo do Rio Grande do Norte, Setur-RN/Emprotur, com recursos do RN Sustentável.

Link para as fotos do ensaio no Flickr
Pipa, Tibaú do Sul, RN//embedr.flickr.com/assets/client-code.js

Quer ver mais da região? Desbrave a série Nordeste @no_rumo do Sem Fim… por @delcueto
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sábado, 24 de setembro de 2016

Morro abaixo que São Paulo ajuda!

rndunas-160826-110-rn-dunas-morro-do-sao-paulo-edino-filhoMorro abaixo que São Paulo ajuda!

Texto e foto de Valéria del Cueto
Depois de lagoa com jegues de chapéus floridos, oásis, dromedários, espetinho de lagosta, travessia de balsa, aventuras escorregadias de skibunda e voadoras de aerobunda, o que mais poderia faltar no meio de tanta beleza?

Seguindo pela fralda de uma duna no litoral potiguar, ao norte de Natal, vê-se ao longe uma praia paradisíaca. De repente, bandeiras vermelhas sinalizam o perigo. As amarelas indicam o caminho: uma guinada forte à esquerda e... o vazio!
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Faltava a adrenalina final, a sensação de despencar no vazio, duna abaixo, sem nenhum aviso ou alerta...

Imagina trabalhar ouvindo gritos a cada um buggy que despenca num dia ensolarado pelo Morro do São Paulo, na praia de Porto Mirim, entre a Jacumã e Muriú, Rio Grande do Grande do Norte? É o que acontece com (Francisco) Edino Rodrigues, 43 anos, de Fortaleza, Ceará, e sua família, há 3 anos vivendo da sensação no pé da duna.
Tecnologia é tudo! Toda a aventura é registrada em fotos e vídeos por 2 câmeras semi-profissionais, disparadas no meio e embaixo da elevação, e um celular, usado pelo responsável por avisar aos demais que o buggy está se aproximando.

Quando o veículo para na parte de baixo da duna, o clima é de alívio, alegria e descontração. Nisso, Edino é craque!rndunas-160826-102-rn-dunas-morro-do-sao-paulo-edino-cerveja-gelada
Para começar, tem bons argumentos para seduzir o turista. Depois do susto, da adrenalina e da aterrisagem, o que é melhor do que uma cerveja branquinha por fora de tão gelada para molhar a garganta ressecada? Também tem água e refrigerante.

Isso enquanto você é convencido a comprar, por 20 reais, as imagens da sua histórica descida. Uma parte do valor é o comissionamento (merecido) dos bugueiros, essenciais para fazer os turistas chegarem ao Morro. Num dia bom descem 70 buggys, 40 param e 32 compram o serviço.

No empreendimento trabalham Edino, Neuma, sua mulher, seus filhos Francisco e Lucas, de 14 anos, que  - moderno - me passa as informações por whatsapp, um tio e mais 3 funcionários.

O chefe da família trabalhava no turismo na região de Natal. Há 20 anos, largou o ramo e foi cuidar da vida. Fez um monte de coisas. Até que, vendendo frango na região da praia de Porto Mirim, conheceu a duna e o cajueiro erótico (outra atração do local) ao seu pé. Demorou um tempo para cair a ficha, vislumbrar a  possibilidade de explorar o local e voltar para o ramo.rndunas-160826-104-rn-dunas-morro-do-sao-paulo-edino-e-seu-cajueiro
“Meu pai já trabalhou em tudo que é digno e nunca deixou nos faltar nada. Ele diz que todo trabalho é digno, só temos que fazer bem feito”, afirma Luca. Na conversa explica que é vendedor, fotógrafo e faz de tudo um pouco. Conta que a parte que mais gosta é quando vê que o turista está satisfeito com o trabalho, “No final de tudo eu digo: foi uma satisfação imensa tirar o seu dinheiro. E ele dá aquela gargalhada de satisfação...”

Os próximos passos serão colocar artesanato para ser vendido e implementar uma cachaçaria com rótulo próprio. O projeto visa multiplicar os empregos na região e divulgar a cultura local.rndunas-160826-109-rn-dunas-morro-do-sao-paulo-tapera
Edino também tem planos a longo prazo. Pretende construir ele mesmo as edificações no terreno usando a técnica e o material que viu seu pai fazer a casa em que morava, no Ceará. “Como uma aldeia de pescadores, tudo de taipa”

Seu xodó é Esther, sua sétima filha,  a única mulher, que tem seu papel na hora de recepcionar os visitantes “quando o turista não compra ela morde o calcanhar dele, ou então chora...”, brinca, todo bobo.

Foi dele que recebi a mensagem no facebook: “Abestada, já comecei a primeira casinha”, cobrando a promessa que pretendo cumprir de voltar lá para registrar em vídeo a história desse cearense arretado e batalhador!rndunas-160826-099-rn-dunas-morro-do-sao-paulo-edino
*A visita ao Morro do São Paulo foi uma sugestão do Sandro Bugueirocondutor do buggy que aparece nas imagens gentilmente cedidas pela equipe @morrodosoapaulo.fotos.video
**Viagem realizada a convite do Governo do Rio Grande do Norte, Setur-RN/Emprotur, com recursos do RN Sustentável.
** Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Crônica da série “Nordeste” do Sem Fim...
Mais descobertas em "Quem procura, acha" e "O povo da Areia" e no Studio na Colab55

domingo, 8 de novembro de 2015

Fome de quê?

Belém 150916 160 Ver o Peso vegetal Banca Pimenta lataFome de que?

Texto e fotos sobre Belém, de Valéria del Cueto
A Itália me chama, mas não posso chegar lá (ainda). Dessa vez fui despertada por um alerta do Periscope,  aplicativo de transmissão de vídeo em tempo real (streaming) do Twitter. Fui parar, ainda dormindo, na abertura da edição 2015 da Artíssima, a feira de arte contemporânea que agita Torino, no Piemonte, no primeiro final de semana de novembro. Em 2013, o evento que ocupa o Oval, pavilhão do Lingotto Fiere, rendeu o texto “Torino, Corso dell’Arte Contemporânea” em que explorava  o evento italiano.
Um pouco mais tarde, outro alerta. Dessa vez é um email da Mendes Wood DM,(de Pedro Mendes, do time de curadores da Artíssima), uma das três galerias brasileiras, dentre as 207 participantes, de 35 países, com obras de Paulo Nimer Pjota. Do Rio, comparecem A Gentil Carioca com peças de João Mode, Rodrigo Torres, Maria Laet, Laura Lima, Thiago Rocha Pitta e a Luciana Caravello, com Nazareno. Artistas brasileiros como Matheus Rocha Pitta e Paulo Nazareth, estão representados nas galerias Sprovieri, de Londres, e Franco Noero, de Torino, respectivamente.
Por que não estou lá? Pergunta uma parte do meu cérebro adormecido. Já totalmente desperta tento responder ao questionamento e volto no tempo. Agora, até Milão onde vi, na mesma viagem, um detalhe que  me incomodou, narrado na crônica Tiro ao Alto: a poluição visual da cidade, com banners e penduricalhos referentes a Expo Milano 2015 que, com o tema “Nutrir  o planeta, energia para a vida”, movimentaria (e  inflacionaria) a cidade lombarda de maio a outubro.
“Alimentando o mundo com soluções”. Com esse slogan lá estivemos nós, nos últimos 6 meses, entre os 145 países que ocuparam gigantescos pavilhões, uma área de 1.1 milhão de metros quadrados, para receber um público estimado em mais 20 milhões de visitantes. O brazuca tinha 4.133 metros quadrados e várias bossas. Entre elas, uma rede suspensa por onde os visitantes passeavam. De 2013 pra cá procurei (sem muito sucesso) informações do que apresentaríamos por lá. O melhor canal, acreditem, era nas notícias veiculadas na Itália. Foi lá que descobri como seria nosso pavilhão, seu projeto arquitetônico e outros detalhes. Queria saber quais as premissas que norteariam nossa participação. Quando a EXPO começou, achei um site oficial que mencionava algumas receitas que seriam apresentadas por lá. Junto a tradicional Caipirinha aparecia um drink chamado Diabo Roxo. Lado a lado com a Feijoada, uma receita de Macarrão com Molho de Soja! Como estava numa fase “paz e amor” preferi não polemizar e acompanhar o que os outros países apresentariam de interessante.
Vi, mais uma vez, o Brasil na fita quando o ex-presidente Lula pontificou numa foto premonitória, literalmente andando na corda bamba, dando pinta na tal rede “multissensorial e imersiva”, atração do  pavilhão brasileiro. E assim se passaram os meses do evento que lotou e movimentou a Lombardia, o Piemonte e o território italiano, razões pelas quais não fiz nenhum esforço para visitar a Itália neste período. Ainda mais com a desvalorização de nossa moeda...
Nada chamou minha atenção positivamente nesse intervalo, especialmente porque expor produtos pecuários e agrícolas como frutas, entre elas morangos (aqueles entupidos de agrotóxicos), não era exatamente relevante para a sustentabilidade planetária. Não estávamos ali para discutir ou inovar, mas para vender o peixe institucional sem maiores questionamentos.
Até o evento dos dois últimos dias no pavilhão: o lançamento do Centro Global de Gastronomia e Biodiversidade da Amazônia. Ele será implantado no Complexo Feliz Lusitânia, em Belém do Pará, para  viabilizar a pesquisa, o ensino e  formação, o fomento econômico, turístico e cultural, com uma escola de gastronomia, laboratório de alimentos, barco-cozinha, museu e restaurante. Pois não é que veio da cidade que completará 400 anos em 2016 a proposta que mais se  coaduna com o tema da ExpoMilano? Como sempre, o Pará. Surpreendente e na vanguarda...
A mais de 3.000 quilômetros no rumo sul, em Uruguaiana, Rio Grande do Sul, juro que em breve atravessarei o país e, novamente, mergulharei nos sabores e saberes paraenses. Enquanto aguardo o inverno passar para, quem sabe, matar o desejo de explorar, mais uma vez, a terra de meus antepassados, a “Bella Italia”.
Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Crônica da série “No Rumo” do Sem Fim...

sábado, 17 de outubro de 2015

Florestas urbanas

Belém 150915 068 Bosque Rodrigues Alves Iara lago amazônia

Florestas urbanas

Texto e fotos sobre Belém, de Valéria del Cueto
Há mais em Belém do que se imagina numa primeira abordagem. A cidade em 2016 comemora  400 anos da sua fundação e foi considerada, na época da áurea do extrativismo da  borracha, de 1890 a 1920, a “Paris n’América”. Pensam que é pouco?
Foi do “Bois de Bologne”, da Cidade Luz que veio a inspiração para a reforma do Parque Municipal, criado em agosto de 1883. Antônio Lemos, intendente municipal, o transforma no Bosque Rodrigues Alves, hoje reconhecido como Jardim Zoobotânico da Amazônia.
Passear por sua área de 15 hectares, é uma viagem à floresta amazônica, com direito a alamedas, viveiros, monumentos e recantos com grutas, riachos e cascatas. São mais de 10 mil árvores, de aproximadamente 300 espécies da região, incluído algumas em extinção. Caso do Cedro, Anjelim Rajado e Talibuca. O clima fica completo com 430 animais, de 29 espécies, que vivem em cativeiro. Outras 26 circulam livremente pelo espaço. São aves, répteis e mamíferos regionais coexistindo em perfeito equilíbrio com a natureza.
Pereira Passos, em 1905 faria a reforma urbanística do Rio de Janeiro. O prefeito carioca se inspirou e bebeu da mesma fonte que o responsável pelas mudanças urbanísticas que até hoje caracterizam Belém. Antes disso, a capital do Pará já havia partido na frente: foi a primeira cidade brasileira a ter luz elétrica e linhas de bonde elétricos. Era o auge do Ciclo da Borracha, em plena Belle Époque.
Da Europa chegam máquinas e peças de ferro, oriundas das mudanças provocadas pela Revolução Industrial. Muitas dessas estruturas podem ser vistas pela cidade. Entre elas o Chalé de Ferro, pré-fabricado e trazido da Bélgica. Montado entre 1882 e 1900, com 378 metros quadrados, serviu de residência e foi realocado no Bosque Rodrigues Alves.
Todo o complexo, que também é um campo de estudos e cultivos de mudas, é responsabilidade da Prefeitura Municipal e gerenciado pela Secretaria de Meio Ambiente.
Um Parque Zoobotânico está bom? Está não... Belém tem, além do Mangal das Garças, (já devidamente destrinchado em “Céu na terra”), mais um lugar especial para interagir com a grandiosidade da natureza local.
Belém 150917 007 Parque do Museu Goeldi preguiça
Museu Emílio Goeldi, instituição de pesquisas ligada ao Ministério da Ciência e Tecnologia, se dedica, desde 1866, a estudar cientificamente os sistemas naturais e socioculturais da Amazônia. São mais de 5 hectares com  2 mil espécies, 600 exemplares da fauna e muitas atividades. Entre elas, exposições sobre temas locais, como “Amazônia, o homem e o ambiente” que ocupa uma das quatro salas do prédio principal, conhecido como Rocinha.
Belém 150917 012 Parque do Museu Goeldi Michel Vilhena e Rafael, pesquisador
Destaco a recepção proporcionada por Rafael, um dos integrantes do Clube do Pesquisador Mirim. Nos abordou uniformizado, de prancheta na mão, querendo que respondêssemos a algumas questões sobre o parque, seus animais e nossas expectativas em relação ao passeio. Compenetrado, nos acompanhou mostrando algumas das atrações que mais gostava. Explicou que não havia chegado ao Clube pela escola, mas pedindo que sua mãe o levasse até o Museu depois de assistir na televisão uma reportagem sobre as atividades dos participantes. As matrículas anuais estavam abertas. “Não parei de perturbar até ela me trazer. Estou adorando.” A ação educativa começou em 1997 e, de lá para cá, foi definitiva na escolha da profissão de inúmeros estudantes que passaram pelo clube. Muitos seguiram carreiras nas áreas de Zoobotânica, alguns São profissionais ligados a instituição.
Talvez esteja na hora do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, fazer uma visita a Belém do Pará para entender como é essencial a existência de um zoológico para uma comunidade. Quem sabe, não volte de lá com noções de como manter esse tipo de estrutura sem precisar entrega-la à iniciativa privada. Todos os espaços aqui citados pertencem e são geridos pelo poder público. Vivendo e aprendendo...
Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Crônica da série “No Rumo” do Sem Fim...
E3- ILUSTRADO - SABADO 17-10-2015
Edição Enock Cavalcanti
Diagramação Nei Ferraz Melo


domingo, 10 de agosto de 2014

Plantar,comer, contar e... colher!

Leme 140807 015 La Fiducia Batata Rostie Recheada
Texto e foto de Valéria del Cueto
Semana passada “Mistura Fina” foi o título de (mais) uma crônica, esta gastronômica, que provocou vários comentários. Logo no início expliquei modestamente que entre meus dotes e talentos a culinária não estava incluída. E não me perguntem o porquê.
Muita gente foi fisgada pelo formato do texto sem saber que durante anos induzida por minha avó tive o prazer de ser leitora assídua do grande Apícius, crítico de gastronomia do Jornal do Brasil. Ele usava esse pseudônimo para escrever sobre restaurantes cariocas. Sempre acompanhado por madames (a mais frequente era a “M”), suas incertas anônimas geravam colunas deliciosas, ora favoráveis, ora desancando os estabelecimentos do Rio. Seu apelido fazia referência a um comilão romano, dos tempos do Imperador Augusto e servia para proteger um dos melhores textos que “assombrou” a imprensa durante mais de 20 anos.
Pois foi sob sua inspiração que durante um tempo, bem no início da década de 90, tive uma coluna gastronômica num jornal de Cuiabá editado pela minha chefa predileta, a jornalista Lígia Lemos, mãe do Marcão, hoje secretário de Comunicação do Estado de Mato Grosso. Não me recordo se no Jornal Independente ou na Tribuna Cuiabana, de Shirley Ocampos.
Durante várias edições falei sobre restaurantes e acepipes que encontrava na capital mato-grossense. Rapidamente consegui entender por que João Roberto Marinho de Azevedo, filho de uma tradicional família carioca, se escondia atrás do codinome romano. Por uma questão de sobrevivência, acabei definindo que iria apenas destacar as qualidades da culinária de Cuiabá e simplesmente ignorar o que não me caía bem no paladar e no estômago.
Mas, como Apícius, adotei um estilo narrativo menos científico e mais poético, o que fazia que a “fantástica” coluna fosse de vento em popa. 
Até o dia em que... para falar da Batata Rostie, acompanhamento que sempre a-mei e só havia encontrado muito bem feita num pequeno restaurante de um casal alemão, talvez no Jardim Tropical, escrevi um texto em que fantasiava que, por causa da batata, o lendário bandido Márcio Martins, o Rambo do Garimpo, preso no batalhão da PM na XV de Novembro, ao encomendar a iguaria e ter seu pedido negando, não resistiu ao desejo e fugiu pelo portão principal, se misturado aos convidados de um casamento que acontecia na igreja em frente, e botou o pé no mundo. Não sem antes passar no restaurantezinho (que, esclarecendo, não era a Casa da Suíça)e degustar uma porção caprichada da iguaria.
Tirando a parte da batata, por incrível que pareça, a fuga realmente havia acontecido como narrava a coluna. Corria na cidade, inclusive, que o mesmo havia molhado a mão do comandante da unidade com uma grande quantidade de ouro!  Pois essa foi a última vez que escrevi regularmente sobre gastronomia. Imagino que vocês calculem o motivo.
Hoje, quando encontro um lugar que prepare o prato com o capricho necessário, sempre penso no bandidão que, involuntariamente, acabou cortando minhas asinhas de crítica gastronômica. Normalmente, quando muito, pincelo o assunto. Era o que ia fazer aqui, falando sobre a evolução da Batata Rostie. Ela,  atualmente,  frequenta meu cardápio recheada por gostosuras como carne seca desfiada com catupiry, no Bistrô La Fidúcia Café, em Copacabana, Rio de Janeiro.
Mas fui fisgada pela lembrança de um tempo em que, no mínimo, bandido ia para a cadeia mesmo que pra fugir depois virando lenda, e Mato Grosso era o lugar que havia escolhido para viver e testemunhar histórias saborosas como uma Batata Rostie que evoluiu e, agora, é recheada de temperos e aventuras (bem) vividas...
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Ponta do Leme”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com

domingo, 3 de agosto de 2014

Mistura fina, de Valéria del Cueto

LemeChap 140727 018 Bar do Davi feijoada de frutos do mar Chapéu Mangueira
Texto e foto de Valéria del Cueto
Nesse tempinho gelado acabamos o jornalista Cacá de Souza e eu, subindo o morro até a entrada do Chapéu Mangueira, aqui no Leme, para uma farra pantagruélica no Bar do David.
Entre shots de cachaça e camarões empanados com catupiry, alcançamos o nirvana caindo de boca num dos pratos mais famosos do bar do filho do Lúcio, morador querido e tradicional da comunidade: a Feijoada de Frutos do Mar.
Cacá, íntimo de David e de todas as atendentes, não deixa de bater ponto no pedaço todas as vezes que vem ao Rio e é mais bem chegado do que eu, que apresentei o point para ele.
Como “autoridade”, foi ele que me fez experimentar a iguaria feita com feijão branco, peixe, mexilhões, camarões, lulas e etc, acompanhada de arroz branco e uma farofinha de alho dos deuses.
Um mix equilibrado de sabores e texturas, daqueles que a gente tem vontade de degustar ajoelhado. Tudo na medida certa, sem que um único tempero se sobreponha aos diferentes tipos de ingredientes do prato, talvez o mais famoso do lugar.
É muito difícil alcançar esse equilíbrio, por exemplo, com tantos pontos diferentes de cozimento ideal. As lulas são mais sensíveis e se passam do ponto podem ficar emborrachadas, os mexilhões nem se fala. Já o peixe precisa de um tempinho maior, para adquirir a textura ideal.
Confesso que como não sou especialista em cozinha, a não ser como consumidora, nem tentei arrancar de Andréia, a garçonete maravilhosa que ainda indica o que está mais caprichado no cardápio do dia, e do sempre simpático e receptivo David, os segredos da Feijoada de Frutos do Mar. Mas, como provadora gastronômica, sou capaz de avaliar o grau de complexidade, apuro e equilíbrio do acepipe servido.
É por isso que posso imaginar a ciência para preparar um prato como a Feijoada de Frutos do Mar, assim como alcanço a complexidade de outras misturas, alimentares ou não, principalmente as com ingredientes díspares e contrastantes.
Cada um tem sua personalidade, sua consistência e características (cor, cheiro e sabor) próprias e precisam ser acomodados e mesclados de forma a valorizar suas qualidades para comporem um novo elemento único e particular.
Um pouco demais, um pouco de menos, o erro no tempo de preparo, no cozimento e na apresentação podem simplesmente “entornar o caldo” transformando uma preciosidade num angu de quinta. Isso vale para outras situações: equipes de trabalho, grupos de amigos e... política.
Compor o quebra-cabeças das chapas que concorrem as eleições 2014 e saber como dosar os ingredientes, qual a ordem correta de juntá-los no caldeirão eleitoral e o tempo ideal de exposição de cada um, é essencial no processo.
E é aí que a porca torce o rabo sem que ele possa ser agregado ao mexidão que teremos em 2014. Até o momento não está dando para definir os diversos sabores e depurar as escolhas, simplesmente por que há de um tudo em todos os agrupamentos que se apresentam.
O resultado são opções insossas e mal finalizadas, com acompanhamentos que tentam aparecer mais que o prato principal, resultando numa gororoba indigesta e mal apresentada para o eleitorado.
Tem gente precisando de umas aulas com o David para aprender que a simplicidade é o principal do cozido...
*Valéria del Cueto é jornalista, fotógrafa e gestora de carnaval. Essa crônica faz parte da série “Ponta do Leme”, do SEM   FIM...  delcueto.wordpress.com
GRAVATA     
Compor o quebra-cabeças das eleições, dosar os ingredientes, a ordem de juntá-los no caldeirão eleitoral e o tempo exposição é essencial no processo.
ILUSTRADO TER A A S BADO     NOVEMBRO  2009